Foto: Marília Marques
Rohingyas foram expulsos de Mianmar, no noroeste de Ásia; grupo vive no país, mas não tem cidadania. G1 visitou região em crise e conversou com refugiados.
Por Marília Marques, G1 Df - 18/05/2019 - 22:12:26
Os 38 graus de temperatura em plena primavera asiática tornam mais difíceis os dias de quase 280 mil famílias que vivem longe de casa, sem emprego e com pouco acesso à agua e à comida em Bangladesh. O grupo, em sua maioria muçulmano, pertence ao povo Rohingya – que, desde 2017, foi expulso de Mianmar e fugiu em massa para o país vizinho.
Bangladesh é quase do tamanho do estado do Ceará, no Brasil, mas concentra 164,7 milhões de pessoas, segundo o governo local. Em números absolutos da população, fica atrás da China, da Índia e do Brasil, por exemplo.
Para acompanhar a crise migratória que a região vive há mais de dois anos, o G1 foi até o campo de refugiados onde o povo sem pátria está acampado. A reportagem visitou o local a convite da embaixada de Bangladesh no Brasil.
A região costeira e cheia de belezas naturais, conhecida como Cox’s Bazar – onde fica a praia mais longa do mundo - contrasta com o chão árido onde 1,1 milhão de rohingyas firmaram território.
Crianças do povo rohingya vivem há dois anos como refugiadas em Bangladesh — Foto: Marília Marques/G1
Para quem chega, o amontoado de casas improvisadas chama a atenção ( veja foto abaixo ). Os abrigos foram montados pelo governo de Bangladesh em parceria com instituições humanitárias que atuam no local.
Em um desses abrigos vive a família do estudante Jamal Hossaim, de 18 anos. Natural de Mianmar, o jovem e a mãe precisaram deixar o país de origem em busca de melhores condições de vida. Eles vivem há dois anos como refugiados em Bangladesh, sem cidadania reconhecida.
Jamal conta que "por questões religiosas" o governo de Mianmar impediu o povo de estudar. "Me sinto triste porque quero estudar e trabalhar, mas não tenho como trabalhar em Bangladesh. Me sinto muito estressado", conta.
"O campo não é suficiente para todos os refugiados, estamos numa estação quente, e as pessoas não se sentem confortáveis. Todos estão estressados."
Abrigos criados em campo de refugiados para o povo rohingya — Foto: Marília Marques/G1
Os rohingyas falam um dialeto próprio e diferente do usado na região onde viviam – Birmânia, no oeste de Mianmar. Por ter a cidadania negada pelo governo, por décadas o grupo vem pedindo refúgio, sobretudo em países como Bangladesh, Malásia, Índia e EUA.
Além disso, a lei no país de origem prevê que apenas os grupos étnicos que podem demonstrar sua presença no território antes de 1823 – data da primeira guerra para colonização da região pelos ingleses – podem obter a nacionalidade birmanesa.
No entanto, representantes dos rohingyas garantem que sua comunidade tinha representantes neste país desde o século XII.
Crianças do povo rohingya vivem como refugiadas em Bangladesh — Foto: Marília Marques/G1
Ainda assim, em 2012, foram registrados atos violentos entre budistas e muçulmanos. Na região, um movimento de monges nacionalistas entrou em confronto com o grupo, por considerar que os muçulmanos representam uma ameaça para Mianmar, um país com mais de 90% de sua população budista.
Acampamento rohingya em Bangladesh — Foto: Marília Marques/G1
De acordo com o governo de Bangladesh, milhares de pessoas fugiram para o país desde o início da violência entre o exército birmanês e os rebeldes, em agosto de 2017.
No campo onde vivem mais de 1 milhão de pessoas, o comissário de Socorro e Repatriamento de Refugiados da Organização das Nações Unidas (ONU), Mohammad Mizanur Rahman, afirmou que a situação "está se tornando insustentável para Bangladesh".
"O governo de Mianmar deve resgatar seu povo, e deve dar a ele direitos de cidadania e direitos humanos", afirmou. "Quando os rohingyas chegaram pela primeira vez aqui, a população local foi a primeira a responder, mas aos poucos a hospitalidade virou hostilidade em alguns casos".
"Houve uma grande mudança demográfica na área, eles [povo bengali] sentem que o mundo está apenas preocupado com os rohingyas."
Menina rohingya pega em água em campo de refugiados em Bangladesh — Foto: Marília Marques/G1
Em entrevista à imprensa, o ministro das Relações Exteriores de Bangladesh, Adbdul Momen, afirmou que organizações internacionais pressionaram o governo de Mianmar para permitir o retorno dos refugiados ao país.
"As autoridades [em Mianmar] não criaram o terreno adequado para o retorno dessas pessoas", disse o chefe da pasta. Momen disse ainda que Mianmar é "responsável pela tragédia do Rohingyas, e, portanto, responsável pela resolução [do problema]".
Veja os números do campo de refugiados em Bangladesh, segundo a ONU
Foto do Rio Naf, na fronteira de Mianmar com Bangladesh — Foto: Arte/G1
No Brasil não há registros de refugiados rohingyas. Apesar disso, segundo dados do Ministério da Justiça, somente em 2017 o país recebeu 33,8 mil solicitações de refúgio, de diversas nacionalidades.
Mais da metade são de venezuelanos que deixaram o país de origem por motivações econômicas e políticas. A situação apesar de difícil para muitos imigrantes em terras brasileiras, não se compara ao que vivem mais de 1 milhão de refugiados na Ásia.
Em Roraima, estado com maior concentração de venezuelanos no Brasil, muitos refugiados ainda dormem em barracas enfileiradas em acampamentos improvisados. Os assentamentos servem de abrigo para centenas de imigrantes que não têm mais para onde ir.
Ao redor do acampamento, militares do Exército patrulham o entorno e quando amanhece, todos são proibidos de ficar na região.
*A repórter Marília Marques, do G1 DF, viajou a convite da Embaixada de Bangladesh no Brasil.
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