Livro aponta os louros de ser um CEO influencer, mas não contabiliza os riscos
Livro aponta os louros de ser um CEO influencer, mas não contabiliza os riscos

Daniele Madureira, São Paulo, Sp (folhapress) - 09/12/2025 17:08:09 | Foto: Divulgação

"Quando publicou 'Cultura da Convergência' [2006], livro que marcou o início da tão anunciada revolução digital, Henry Jenkins afirmou que tudo estava mudando simultânea e desordenadamente, e que parecia não haver um ponto privilegiado, fora dessa confusão, que permitisse enxergar e compreender as coisas."
A menção feita pela professora do Departamento de Comunicações e Artes da ECA-USP (Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo) Issaaf Karhawi, no prefácio do livro de Carolina Terra "De Funcionários a Influenciadores: Por Que Ter Programas de Funcionários Influencers Vale a Pena" (Summus, 2025), evidencia o quão fugaz parece ser qualquer análise sobre o impacto das mídias sociais no cotidiano dos indivíduos.

Na obra, Carolina Terra, mestre e doutora em ciências da comunicação pela USP, dona de uma consultoria de mídias sociais e relações públicas digitais, busca convencer o leitor de que "funcionários e líderes podem ser utilizados como instrumento de construção de imagem e reputação para as marcas que representam, mas também como tais iniciativas podem ser benéficas para eles e suas carreiras".

De fato, a autora destaca que marcar presença nas redes sociais hoje contribui para formar o próprio "capital social" -um dos três capitais sobre os quais fala o sociólogo francês Pierre Bourdieu, para quem a sociedade é um campo de lutas por capital econômico, cultural e social. Este último é proporcional ao tamanho das redes de conexão que o indivíduo consegue mobilizar. Se a sociedade está nas redes, é para lá que precisam se dirigir os presidentes de empresas e os funcionários, segundo Carolina.

Mas a obra reforça apenas o quão relevante é para o CEO se expor de maneira estratégica nas comunidades virtuais. Nesses espaços, os executivos têm a chance de chamar a atenção não apenas para o seu talento pessoal à frente dos resultados da companhia como expor o engajamento da equipe, o que conta pontos para o seu currículo.

Para os funcionários em geral, porém, Carolina indica que o público vê com bons olhos quando trabalhadores se mostram comprometidos, que isso reforça a imagem da companhia (até para atrair novos talentos) e que os funcionários devem ser não só incentivados mas de alguma forma remunerados pelo trabalho como influenciadores.

Toda essa análise é verdadeira, mas está datada: pelo menos no Brasil, se mostrou plausível até meados de 2023. Como um dos países que mais consomem conteúdo de redes sociais no mundo, o Brasil viu uma avalanche de influencers, de todos os tamanhos, desde as estrelas da música e da TV até os vizinhos e colegas de trabalho, tomarem conta das redes sociais.

O excesso gerou um aumento do escrutínio: o público não se deixa levar por qualquer apelo ou discurso, especialmente os ligados a fins comerciais. Sim, o brasileiro vem consumindo cada vez mais conteúdo de influencers, mas o peso sobre a decisão de compra é limitado, conforme apontou pesquisa realizada em setembro pela consultoria Ponto Map em parceria com a V-Tracker, publicada pela Folha.

De acordo com o levantamento, apenas 19% afirmam ter comprado produtos a partir de posts de influenciadores nos últimos três meses. Um percentual ainda inferior (13%) mudou de opinião sobre algum tema. Quase metade da população (49%) afirma não tomar decisões baseadas em influenciadores.

O que se viu nos últimos anos é que os funcionários não se tornaram influencers de fato de seus empregadores, uma vez que existe certa desconfiança do público em ver amigos e conhecidos falando bem nas redes sociais de empresas com quem mantêm vínculo empregatício. Pesquisas como a da Ponto Map já mostraram que os usuários buscam autenticidade nas redes. Eles entendem que a publicidade faz parte do negócio dos influencers, mas desejam que o patrocínio esteja explícito no post.

As companhias, por sua vez, passaram a apostar muito mais nos nano e microinfluenciadores, aqueles que têm mais vínculo com determinados segmentos da sociedade, para inserir suas marcas nos conteúdos que eles geram.

Carolina Terra cita como exemplo de empresa que criou a figura do funcionário influencer o Itaú, com o programa de "iTubers". Em setembro, no entanto, o banco acumulou críticas nas redes sociais após uma demissão em massa de mil funcionários por suposta baixa produtividade no home office e "padrões incompatíveis com os princípios de confiança". Foram dispensados inclusive trabalhadores que haviam batido metas e haviam sido promovidos.

A partir dos exemplos apontados pela autora, fica claro que a exposição nas redes acontece com maior naturalidade quando se trata de fundadores e membros da família controladora da empresa. São citados os casos de Caito Maia (Chillibeans), Cristina Junqueira (Nubank), Karla Felmanas (Cimed), Luiza Trajano (Magalu) e Stelleo Tolda (Mercado Livre). João Branco é o único exemplo de um não CEO, e que não está mais no cargo: ele foi o principal executivo de marketing do McDonald's, responsável pela criação da marca "Méqui", que decidiu enveredar pela carreira solo como consultor, mentor e palestrante.

Entre os CEOs, a autora também aponta como exemplo o empresário Alê Costa, que fundou a Cacau Show em 1988, aos 17 anos. "Está no Facebook, Instagram, LinkedIn, TikTok e no X", diz Carolina Terra. "É visto como um líder acessível e carismático, que se preocupa com seus funcionários e clientes."
Reportagem da Folha publicada em 31 de maio revelou o clima de medo por parte de franqueados da Cacau Show, que acumulam dívidas por taxas que consideram abusivas junto à companhia. Os relatos falam de ameaças veladas ou diretas recebidas de consultores da empresa, além do culto à personalidade do fundador da rede.

Conforme previsto pelo pesquisador de mídia americano Henry Jenkins, tudo muda "simultânea e desordenadamente" com as redes sociais. Quanto maior a exposição, maior a cobrança pública.

DE FUNCIONÁRIOS A INFLUENCIADORES: POR QUE TER PROGRAMAS DE FUNCIONÁRIOS INFLUENCERS VALE A PENA
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Autoria Carolina Terra
Editora Summus