A indústria do nada que acaba levando tudo ao nada
A indústria do nada que acaba levando tudo ao nada

Por João Zisman - 02/11/2025 10:14:30 | Foto: João Zisman - Imagem

O Brasil descobriu o negócio do século: vender o nada. Enquanto a indústria patina, o agronegócio enfrenta estiagens e a cultura procura patrocínio, o mercado da futilidade segue aquecido. É o setor mais dinâmico da economia nacional, com lucros expressivos e custo de produção zero. A única matéria-prima é a vaidade.

O PIB da futilidade cresce em ritmo chinês. Milhões de consumidores passam horas aplaudindo quem se grava abrindo uma caixa, tomando café ou fazendo cara de quem “acorda linda”. É o empreendedorismo do espelho. A economia criativa virou economia exibitiva. A criatividade cansou, e a exposição assumiu o comando.

O novo profissional de sucesso não precisa de diploma, talento ou vocação. Basta uma boa conexão e um ring light. Em vez de produzir algo, basta parecer ocupado. O conteúdo é o próprio rosto, o produto é a própria vida, e o lucro vem da curiosidade alheia.

Enquanto isso, os trabalhadores do mundo real seguem presos à planilha, ao ponto eletrônico e ao contracheque. Produzem, suam, entregam. Mas o mercado valoriza mesmo é quem domina a arte de não fazer nada com estilo. O mérito virou enquadramento.

O sistema financeiro já estuda criar linhas de crédito baseadas em número de seguidores. O Serasa talvez passe a medir risco de influência. Afinal, quem precisa de capital intelectual quando se tem capital social? O capitalismo descobriu que o vazio dá lucro, desde que venha com boa iluminação.

O país que sempre viveu do jeitinho encontrou agora o jeitinho digital. A última inovação é transformar irrelevância em negócio, mediocridade em marca, e tédio em renda passiva. O Brasil exporta commodities, mas importa exemplos ruins com entusiasmo exemplar.

E ninguém parece se incomodar. O entretenimento virou anestesia coletiva. Em vez de pão e circo, bastam Wi-Fi e stories. A desigualdade se dissolve por alguns segundos entre uma dancinha e um publi de perfume. O país afunda, mas o algoritmo não deixa ninguém perceber.

No fim das contas, a indústria do nada é a mais rentável de todas. Cresce sem produzir, lucra sem empregar e encanta sem dizer nada. O PIB da futilidade é o retrato fiel do nosso tempo: um país que se diverte enquanto o conteúdo vai embora de fininho, sem fazer barulho.