David explica como religiões de matriz africana acolhem pessoas excluídas.
Por adele Robichez e rafaella Coury - Portal Brasil De Fato - 06/06/2025 07:02:27 | Foto: David Dias: “Não é sobre a religião ou a fé do outro, é sobre a cor daquele que professa aquela fé” - Divulgação
Mestre em Ciência da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e doutorando pela Universidade de São Paulo (USP), o pai de santo David Dias afirma que o preconceito que recai sobre as religiões de matriz africana está diretamente ligado ao racismo estrutural no Brasil. “A sociedade rechaça coisa que é de preto”, resume, em entrevista ao BdF Entrevista , da Rádio Brasil de Fato.
“Não é sobre a religião ou a fé do outro, é sobre a cor daquele que professa aquela fé”, explica. Para ele, o que se vê é uma rejeição da sociedade a tudo que é preto, da cultura à prática espiritual, ainda que isso seja consumido e apropriado pela parcela não-negra da população. Por isso, a violência é sofrida inclusive por pessoas brancas que frequentam terreiros e utilizam símbolos religiosos como os fios de conta.
“Ela sofre racismo não em virtude do que ela é, nem mesmo do que ela acredita. Ela sofre racismo em virtude de utilizar de elementos que são de gente preta, de uma cultura negra, de deus negro, que vem de África”, indica. “Se ela tira esses fios de conta, passa tranquilamente, inclusive de médica ou dentista. Agora, quando ela coloca esses fios de conta, é macumbeira, mexe com coisa de preto, ela é um problema, ‘temos que eliminar’”.
Religiões de matriz africana como espaço de acolhimento
Criador do podcast Atina Pra Isso! , David Dias explica que a Umbanda e outras religiões afro-brasileiras funcionam como territórios de acolhimento e reconstrução familiar para pessoas que historicamente foram excluídas. “Umbanda é uma cultura negra de matriz afro-brasileira que tem como propósito o culto, a valorização e a exaltação de povos ancestrais socialmente excluídos”, afirma. “A Umbanda concede família, a Umbanda concede pai, a Umbanda concede irmãos”.
Ele destaca que esse acolhimento ultrapassa as barreiras raciais, alcançando também trabalhadores precarizados, como entregadores por aplicativos, e pessoas LGBTQIA+. “Quando falamos sobre pessoas excluídas socialmente estamos falando de uma gama muito mais ampla”, destaca. “É muito importante entender o terreiro como esse lugar de produção de família, esse lugar de preservação de cultura afro-brasileira”.
Para além da fé individual, David ressalta que as religiões afro têm como pilar o rito coletivo, o que confronta diretamente valores do individualismo moderno. “No terreiro não se faz nada sozinho. No terreiro se propõe um resultado coletivo”, fala. “Ainda que eu consiga fazer algo sozinho no terreiro, fazer acompanhado é melhor”.
Essa coletividade também se manifesta na relação com o território. “Onde há religião, há política. […] O terreiro é um espaço que, querendo ou não, deve entender a sociedade a qual ele ocupa”, diz, apontando a necessidade de se ter consciência política sobre o entorno e de como políticas públicas impactam esses espaços. “Se eu não tiver noções políticas do espaço que eu ocupo, é como se eu estivesse com um terreiro em outro planeta.”
Para ouvir e assistir
O BdF Entrevista vai ao ar de segunda a sexta-feira, sempre às 21h, na Rádio Brasil de Fato, 98.9 FM na Grande São Paulo. No YouTube do Brasil de Fato o programa é veiculado às 19h.
Editado por: Martina Medina
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