Brasileiros queriam ingressar em voos que o Itamaraty para retirar turistas das Filipinas, da Tailândia e Vietnã.
Por Letícia Macedo, G1 - 10/04/2020 09:59:01 | Foto: Arquivo pessoal
A notícia de que voos de repatriação vão trazer os brasileiros que estão na Tailândia, na Indonésia, no Vietnã e na Indonésia trouxe muita preocupação para os grupos que estão retidos no Camboja e no Laos. Eles não têm previsão de voltar nos aviões que partem nos próximos dias e alguns já precisam da ajuda da embaixada para se manter.
Joice Pacheco e Francisco Junior aguardam, no Camboja, um voo de repatriação — Foto: Arquivo Pessoal
Surpreendidos pela rápida expansão do coronavírus na Ásia, os brasileiros que viajam pela região se deparam com fronteiras fechadas e voos extremamente caros – quando eles ainda existem.
“Foi uma decepção total descobrir que não íamos conseguir entrar dessa vez em voo de repatriação. Soube disso na segunda-feira (6) e passei o dia inteiro chorando”, afirmou a turista do Rio de Janeiro Joice Pacheco, que atualmente está na cidade de Siem Reap, a 400 km da capital da Tailândia, Bangcoc.
Ela e o marido, autônomo Francisco Junior, tentaram antecipar a volta para o Brasil quando começaram a ver que os voos começaram a ser cancelados, porém a companhia aérea afirmou que só poderiam fazer remarcação a partir do dia 25, cinco dias antes da data prevista para o embarque. Enquanto isso, eles seguiram para o Camboja, onde foram registrados 119 casos de infecção pelo Sars-Cov-2 - número muito inferior aos mais de 450 mil dos EUA.
“Chegamos aqui no dia 20 e no dia 22 ficamos sabendo que as fronteiras tailandesas foram fechadas. No dia 23, soubemos que o voo tinha sido cancelado e Emirates Airlines não ofereceu nenhuma realocação.”
“O nosso hostel não queria aceitar que fizéssemos reserva pela internet. Pelo site pagaríamos com cartão, era uma maneira de guardar dinheiro para comer. O cara expulsou a gente na maior: ‘Sem dinheiro, sem hospedagem’”, conta.
O casal mudou de hospedagem e passou uns dias se virando como podia. “Passamos uma semana em que só almoçávamos ou jantávamos. Comprávamos um cacho de banana, um biscoitinho mais barato e, assim, passávamos o dia. Estava contando que ia embora. Quando soube que não iria pode embarcar nesse voo, eu desabei e tive que pedir ajuda para a embaixada. Não dava para ficar mais com uma refeição diária.”
Uma turista de São Paulo, que pediu para não ser identificada para não assustar a família, também não conseguiu deixar o Camboja no dia 30 em direção à Tailândia, de onde partiria o seu voo para o Brasil. Orientada pela agência de viagens, ela chegou a se deslocar até o aeroporto, mesmo sabendo que o voo estava cancelado, e foi obrigada a dormir em um banco.
Atualmente, ela está de favor na casa de amigos. “O remédio do coração já acabou, o da hipertensão ainda tenho três”. Como o visto dela expiraria no dia 14, ela decidiu se antecipar e pedir uma renovação do visto. “Eu enviei o meu passaporte para eles porque na semana que vem os órgãos públicos estarão fechados por causa de um feriado prolongado”, conta.
Sem recursos financeiros, ela também recorreu à representação diplomática da região para obter uma ajuda de custo. “Só que eles me enviaram o dinheiro e eu não posso retirá-lo porque estou sem o meu passaporte que aguarda a conclusão da emissão do visto para ser liberado”, conta.
Ela conta que sentiu uma “dor no coração” ao saber que, mesmo estando perto, não poderia embarcar.
“Em nenhum momento chorei ou me desesperei, mas é muito frustrante saber que vai ser deixada para trás. Eles dizem que estão buscando alternativas”, afirma.
Os voos disponíveis para quem está no país custam entre R$ 10 e 11 mil nesse momento. “Não sabemos nada sobe a idoneidade da empresa. Tudo é muito incerto: e se eles chegam lá eles cancelam? Além disso, eu não tenho esse dinheiro e nem limite para comprar passagem nesse valor. É totalmente fora da minha realidade”, desabafa.
Giancarlo Dariva e Tatiane Pereira, que estão no Laos, decidiram concluir tour pela Ásia por causa da crise do coronavírus — Foto: Arquivo pessoal
O casal Tatiane Pereira, de 35 anos e Giancarlo Dariva, de 37, tiveram que refazer os planos e antecipar a volta ao Brasil por causa da crise do coronavírus. Eles perceberam que a situação estava se complicando quando cruzaram a fronteira do Vietnã com o Laos.
Os agentes vietnamitas perguntaram várias vezes se, de fato, eles não tinham intenção de voltar para o país deles. Os turistas de Guarulhos (São Paulo) queriam apenas prosseguir sua viagem, que ainda duraria pelo menos mais um ano e três meses.
Mais tarde, eles souberam que logo após cruzarem a fronteira, ela foi fechada. Desde então, o casal negocia com a representação diplomática local alternativas para voltar ao Brasil.
“No Vietnã a gente já sentiu um pouco de hostilidade. É muito forte a ideia de que as pessoas de foram estão trazendo a doença. Andando por vilarejos, vimos crianças que colocavam mão no rosto quando viam a gente. Também ficou mais complicado encontrar hotel, entrar nos supermercados. A segurança fica comprometida quando as pessoas estão dominadas pelo medo”, destaca Tatiane.
A administradora de empresas conta que o casal está acostumado a fazer algumas concessões durante a viagem. “Mas nossa maior preocupação é com sistema de saúde para estrangeiros. O sistema de saúde público é precário, é um dos mais pobres da Ásia.”
Sem ajuda do governo brasileiro, o casal não consegue nem mesmo deixar a cidade de Vang Vieng, no norte do país, por causa dos bloqueios impostos ao sistema de transportes e às fronteiras.
A Embaixada disse ao casal que 10 brasileiros pediram repatriação no Laos, o que é um número pequeno para justificar um voo fretado exclusivo.
“Eles também disseram que, infelizmente, há sérias dificuldades técnicas e financeiras para incluir uma parada no Laos e no Camboja. Por isso, a gente acaba se sentindo um pouco abandonado, porque a gente está bem perto [de onde os aviões vão passar]. O nosso medo é acabar esquecido”.
Até o momento a universidade americana Johns Hopkins informa que 16 casos foram registrados no Laos. “Mas aqui é muito difícil obter informações. Temos um site com informações em inglês que parece de um jornal da capital. As informações sobre contaminados começaram a aparecer por volta de 22 de março, mas ninguém sabe se esse número é correto. ”
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