‘Deixe a burocracia chata que não serve para nada e venha prender o Lula’, disse Deltan a colega

O procurador Deltan Dallagnol apresentando power point em coletiva de imprensa de 2016. Foto: Geraldo Bubniak/Estadão

‘Deixe a burocracia chata que não serve para nada e venha prender o Lula’, disse Deltan a colega
‘Deixe a burocracia chata que não serve para nada e venha prender o Lula’, disse Deltan a colega

Estadão Conteúdo - 22/02/2021 20:23:53 | Foto: Geraldo Bubniak/Estadão

‘Deixe essa burocracia chata que não serve pra nada e vem pra cá você também, venha prender o Lula’, disse Deltan a colega, mostram diálogos hackeados da Lava Jato

Defesa do ex-presidente apresentou ao Supremo Tribunal Federal nesta segunda-feira, 22, novo pacote de mensagens da Operação Spoofing liberadas ao petista; conversas também apontam registro de termo de depoimento de testemunha que não teria sido ouvida pela Polícia Federal, além de supostas colaborações informais com autoridades estrangeiras

Desde que recebeu autorização para acessar mensagens hackeadas da força-tarefa Lava Jato , apreendidas na investigação que prendeu o grupo responsável pelo ataque cibernético, a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ( PT ) vem apresentando ao Supremo Tribunal Federal (STF) laudos feitos por um profissional independente contratado para periciar o material.

A análise tem sido feita em etapas em razão do volume de conversas interceptadas. A cada relatório, novos trechos vêm à tona e movimentam a opinião pública. No documento mais recente, enviado ao Supremo nesta segunda-feira, 22, as mensagens mostram que uma delegada da Polícia Federal teria lavrado o termo de depoimento de uma testemunha sem que ela tivesse sido de fato ouvida.

“Como expõe a Erika: ela entendeu que era pedido nosso e lavrou termo de depoimento como se tivesse ouvido o cara, com escrivão e tudo, quando não ouviu nada… DPFs [Delegados de Polícia Federal] são facilmente expostos a problemas administrativos”, teria escrito o então coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, em uma conversa com o procurador Orlando Martello Júnior no dia 26 janeiro de 2016.

Segundo os diálogos transcritos, o colega sugere: “Podemos combinar com ela de ela nos provocar diante das notícias do jornal para reinquiri-lo ou algo parecido. Podemos conversar com ela e ver qual estratégia ela prefere. Talvez até, diante da notícia, reinquiri-lo de tudo. Se não fizermos algo, cairemos em descrédito. O mesmo ocorreu com padilha e outros. Temos que chamar esse pessoal aqui e reinquiri-los. Já disse, a culpa maior é nossa. Fomos displicentes!!! Todos nós, onde me incluo. Era uma coisa óbvia q não vimos. Confiamos nos advogados e nos colaboradores. Erramos mesmo!”.

Deltan concorda então com a sugestão, mas observa: “Se o colaborador e a defesa revelarem como foi o procedimento, a Erika pode sair muito queimada nessa… Pode dar falsidade contra ela… Isso que me preocupa”.

Na época, a Operação Lava Jato era integrada pela delegada Érika Marena , que atuou nas investigações de Curitiba desde o seu início. No entanto, não é possível atestar que o diálogo faz referência a ela, uma vez que o sobrenome não é citado. Em 2018, Érika chegou assumir a direção do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, a convite do então ministro Sérgio Moro, mas acabou exonerada depois que ele deixou o governo federal.

No mesmo pacote de mensagens, a defesa do petista reuniu conversas que apontariam para colaborações ‘informais’ entre os procuradores e autoridades estrangeiras. Desde que começaram a entrar com pedidos judiciais para ler toda a documentação relacionada ao acordo de leniência firmado entre a força-tarefa e a Odebrecht, com participação de autoridades dos Estados Unidos e da Suíça, os advogados de Lula acusam os investigadores de ‘ocultar’ trocas de documentos e informações.

Em uma das conversas, em 29 outubro de 2016, o procurador Orlando Martello Júnior avisa sobre a aposentadoria de um procurador suíço. “Isso vai complicar muito para nós, pois ele é quem nos passa informação”, diz.

No mesmo documento, mensagens atribuídas a Deltan Dallagnol indicam que ele teria feito pedidos informais para acessar dados sigilosos da Receita Federal dirigidos ao auditor Roberto Leonel, posteriormente alçado à presidência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) pelo ex-ministro Sérgio Moro. Leonel foi exonerado do cargo no período de reestruturação do órgão, que foi tirado do guarda-chuva do Ministério da Justiça e Segurança Pública e transferido para o Ministério da Economia, passando a responder ao Banco Central.

“Roberto, você poderia levantar para mim o patrimônio brasileiro que têm as pessoas abaixo? Preciso informar, para fins de inteligência, a Suíça”, teria escrito Deltan.

Em julho de 2016, em uma troca de mensagens no grupo de Telegram da força-tarefa, o procurador Januário Paludo reclama do volume de trabalho. “Eu não aguento mais fazer relatório de sindicância e de correição!!!! Socorro!!!!”, diz aos colegas.

O procurador Roberson Pozzobon responde: “Saia daí e venha pra cá conosco!!! Não é para férias, mas para um trabalho divertido ”.

“Deixe essa burocracia chata que não serve pra nada e vem pra cá você também January. Venha prender o Lula”, completa Deltan.

Menos de dois meses depois, o Ministério Público Federal apresentou a primeira denúncia contra o ex-presidente, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro na investigação sobre cartel e propinas na Petrobrás. Na ocasião, o então coordenador da força-tarefa apresentou as acusações com a ajuda da famosa apresentação de PowerPoint.

Desde que trechos das conversas começaram a ser divulgados na série de reportagens conhecida como ‘Vaza Jato’, liderada pelo portal The Intercept Brasil em parceria com outros veículos de imprensa, os procuradores negam a autenticidade dos diálogos. A força-tarefa sustenta que o material foi obtido ilegalmente no ataque cibernético e pode ter sido adulterado pelos hackers.

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