Inhotim mira arte indígena em mostra que celebra o pavilhão de Claudia Andujar

O trabalho do artista, ele próprio um indígena, do povo Desana, é um dos mais impactantes da exposição que marca os dez anos do pavilhão de Andujar no museu próximo a Belo Horizonte

Inhotim mira arte indígena em mostra que celebra o pavilhão de Claudia Andujar
Inhotim mira arte indígena em mostra que celebra o pavilhão de Claudia Andujar

São Paulo, Sp (folhapress) - João Perassolo - 07/05/2025 11:19:46 | Foto: Instituto Inhotim/Divulgação

Era noite na floresta quando um grupo de indígenas de vários povos se reuniu em meio às folhagens exuberantes de Inhotim. Munidos de uma tinta que brilha no escuro, eles pintaram seus corpos com grafismos típicos de suas etnias.

Fluorescentes e coloridos, viraram modelos e foram fotografados por Paulo Desana. O resultado é uma série de retratos, a um só tempo vivos e ameaçadores, expostos agora na galeria da fotógrafa Claudia Andujar em Inhotim.

O trabalho do artista, ele próprio um indígena, do povo Desana, é um dos mais impactantes da exposição que marca os dez anos do pavilhão de Andujar no museu próximo a Belo Horizonte.

Para a mostra, que inaugurou em 26 de abril e fica em cartaz por tempo indeterminado, os organizadores convidaram outros 21 artistas de povos originários do Brasil e da América do Sul para exporem suas obras ao lado das de Andujar, criando assim um diálogo entre gerações e estéticas distintas.

A suíça, hoje com 94 anos, dedicou sua vida à causa yanomami, primeiro com retratos da vida nas aldeias e dos rituais deste povo, e depois com ativismo. Andujar foi uma das principais responsáveis pelo processo que levou à demarcação da terra deste povo, em 1992. Ela é tão importante para a etnia que é chamada de "mãe" por eles, de acordo com Davi Kopenawa, xamã e líder político do povo yanomami.

Os artistas convidados mostram "obras que não surgiram como objetos artísticos —surgiram como ferramenta de luta", diz Júlia Rebouças, a diretora artística de Inhotim, em referência ao teor político, de denúncia e protesto, do que está exposto, em sua maioria fotografias e vídeos.

Por exemplo, Edgar Xakriabá registra a luta indígena em protestos, como a marcha do Acampamento Terra Livre em Brasília. Ele conta que começou a fotografar, já com as câmeras digitais nos anos 2000, quando a associação de sua aldeia, no norte de Minas Gerais, adquiriu equipamentos para registrar os projetos que desenvolvia —ele retratou casamentos e rituais.

Com o tempo, Xakriabá desenvolveu um entendimento artístico da imagem, o que se nota pelas suas fotos, com uma carga de dramaticidade acentuada pelo preto e branco que escolhe. No museu, suas fotos estão dispostas junto a uma série de Andujar na qual ela experimenta com a luz, em retratos de um garoto brincando no interior de uma oca iluminada por frestas de sol que entram pela cobertura.

A opção dos organizadores de disporem trabalhos de indígenas contemporâneos ao lado de fotos de uma artista que dedicou sua existência à luta dos povos originários faz todo o sentido, porque isso "amplia, contextualiza e complexifica a leitura da obra" de Andujar, segundo Beatriz Lemos, uma das curadoras da mostra.

Esta opção também evidencia a qualidade monstruosa do trabalho de Andujar —uma das principais fotógrafas do Brasil, com amplo reconhecimento internacional—, o que todos já sabem, mas que ganha nova dimensão diante de obras de artistas com menos experiência de vida e menor vocabulário artístico.

A exposição traz artistas menos conhecidos do circuito, como o peruano David Díaz Gonzales, com uma série de belos retratos de mulheres. Também estão presentes nomes cuja abordagem desafia as expectativas tradicionais de um museu, como Graciela Guarani, que apresenta registros do cotidiano na aldeia Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, e Tayná Uráz, com retratos documentais da vida na aldeia Maracanã, no Rio de Janeiro.

A exposição não se furta a deixar para segundo plano os aspectos estéticos quando acha necessário, se este for o preço a pagar para incluir mais indígenas no circuito das artes visuais. Mas parece haver um bom motivo para tanto. Segundo Rebouças, a diretora artística, "não é possível separar a arte da vida, do modo de existir [indígena]", e "não há arte indígena sem ativismo".

GALERIA CLAUDIA ANDUJAR I MAXITA YANO. DE QUA. A SEX., DAS 9H30 ÀS 16H30; SÁB., DOM. E FERI., DAS 9H30 ÀS 17H30
- Quando Tempo indeterminado de duração
- Onde Inhotim - Povoado Inhotim - R. B, 20, Brumadinho
- Preço De R$ 30 a R$ 60; grátis às quartas e no último domingo do mês
- Link: https://www.inhotim.org.br/eventos/maxita-yano/

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