Quem é Pelagie Gbaguidi, que usa a arte para exorcizar traumas do colonialismo

Exposição leva ao público trabalhos produzidos durante a residência artística que ela fez em Salvador, em fevereiro deste ano

Quem é Pelagie Gbaguidi, que usa a arte para exorcizar traumas do colonialismo
Quem é Pelagie Gbaguidi, que usa a arte para exorcizar traumas do colonialismo

São Paulo, Sp (folhapress) - Matheus Rocha - 28/04/2025 18:36:24 | Foto: Site oficial Fortes D'Aloia & Gabriel

A artista plástica Pélagie Gbaguidi é uma griô contemporânea, ou seja, uma pessoa que preserva e transmite as histórias de seu povo. No entanto, no lugar da voz e da palavra, ela escolheu a tinta e o pincel para transmitir essas narrativas. Seus trabalhos são como contos que nos lembram que a violência colonial do passado continua a reverberar no presente.

É isso que está implícito em "Fragmentação", um trabalho em que a artista pintou cenários distópicos em 11 papéis usados para embrulhar pão. Na obra, é possível ver paisagens naturais destruídas, numa alusão ao extrativismo que tem depauperado países do chamado sul global desde as grandes navegações.

"Quero contar a história que foi mascarada e fazer as pessoas se lembrarem do que foi apagado com a escravidão", diz Gbaguidi, enquanto apresenta obras reunidas na mostra "Manifestação", em cartaz na galeria Fortes d'Aloia e Gabriel, na capital paulista.

A exposição leva ao público trabalhos produzidos durante a residência artística que ela fez em Salvador, em fevereiro deste ano.

A pintura "Mango Tree", por exemplo, foi produzida durante a estadia de Gbaguidi na capital baiana. A obra foi inspirada em uma árvore que chamou atenção da artista em razão das suas grandes dimensões.

Posteriormente, ela descobriu que a árvore marcava o cemitério onde participantes da Revolta dos Malês haviam sido enterrados. Esse movimento aconteceu em 1835 e foi o maior levante urbano de escravizados do Brasil.

"De fato, eu acredito que temos que aceitar que vivemos num estado de trauma coletivo gerado por séculos de guerras, genocídios e sistemas de predação dos corpos e da natureza", diz Gbaguidi, que usa a arte para exorcizar esses traumas coletivos.

"Meu engajamento artístico me levou a enfrentar questões de identidade, como a história do povo negro e a sua relação com o mundo ao longo do tempo. Esses eventos históricos também me ajudaram a compreender melhor as questões culturais e econômicas contemporâneas."
Nascida no Benin, a artista tem obras em acervos de instituições como Kanal - Centre Pompidou, em Bruxelas, Centre National des Arts Plastiques, em Paris, e Holocaust Memorial Foundation, em Chicago.

Suas obras se destacam pelo caráter híbrido, misturando abstração e arte figurativa. Exemplo desse hibridismo é "Momento", trabalho em que pintou mãos e pés envoltos por traços sinuosos.

"Meu pensamento abraça todas as formas, e elas se misturam entre si para formar uma linguagem. A obra torna-se linguagem e a forma torna-se espírito", diz a artista, para quem a separação entre arte abstrata e figurativa é antiquada.

"A abstração e a figuração pertencem a juízos estéticos acadêmicos, que estão sujeitos à mutação e, portanto, são obsoletos."
Além do hibridismo, o trabalho de Gbaguidi é marcado pela valorização da oralidade, ou seja, o conhecimento transmitido não por livros, mas por meio da fala. A oralidade, aliás, está no centro do que é ser uma griô.

"Essa é uma figura que tomou forma como um postulado no cruzamento da memória, da história, da oralidade e da imagem. [Ser uma griô] tem sido um catalisador na minha abordagem artística", diz ela. "Tive o sentimento urgente de que tínhamos que transmitir o nosso conhecimento para afastar a amnésia da revolução digital."
MANIFESTAÇÃO
- Quando De terç. a sex., das 10h às 19h. Sáb., das 10h às 18h . Até 17 de maio
- Onde Fortes D'Aloia & Gabriel - Rua James Holland 71, Barra Funda
- Preço Gratuito
- Classificação Livre

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