Os governos preferem continuar pensando de quatro em quatro anos, pois é isso que interessa aos representantes, eleitos por uma sociedade que também parece silenciosa e apática diante do monstro que alimentamos e que irá nos engolir.
Por Mario Moscatelli - Lulacerda - 24/09/2019 18:47:46 | Foto: Olho Verde-Mario Moscatelli
Nessa sexta (20/09), em vários países do mundo, jovens se uniram em manifestações em defesa do Planeta. O tema ambiental saiu dos restritos círculos acadêmicos e vem, progressivamente, tomando algumas ruas. Não todas; por exemplo, apenas 30 jovens cariocas sentaram nas escadarias da ALERJ. Melhor isso do que nada.
À medida que o clima mostra, a cada ano, de forma mais evidente, que algo de fato está mudando e afetando a vida de milhões de pessoas, a turma mais jovem, sem rabo-preso e normalmente mais aberta às novas realidades, está sentido que, se não se mobilizar e pressionar, a turminha que manda no Planeta, megaconglomerados econômicos e seus despachantes de luxo, os políticos – não todos, mas a maioria – não irão se mexer. Aliás, não duvido nada que, diante das claras evidências de mudanças climáticas e suas consequências, esse pequeno clube de luxo já esteja com planos de faturar ainda mais. Afinal, o que interessa é faturar, seja como for e em que condições forem.
Um tsunami de lixo na Lagoa da Tijuca, lugar onde a ficha ainda está longe de cair /Foto: Olho Verde/Mario Moscatelli
Como quem manda, a maioria deverá estar morta ou quase isso nos próximos 30-40 anos, quem negou as alterações climáticas pouco está se importando com o que está vindo, ou já está acontecendo. Faz parte do jogo: para alguém ganhar, alguém tem que perder. O problema é que quem ganha, geralmente, são os mesmos e representam uma parcela mínima de quem irá perder e pagar a conta por tanto descompasso.
A decisão individual e coletiva que temos tido a respeito do tema ambiental no Rio: usar até acabar /Foto: Olho Verde/Mario Moscatelli
Anualmente, a realidade humana, com suas demandas, entra, cada vez mais cedo, no cheque especial planetário, isto é, temos gastado, anualmente, cada vez mais, comparado com a capacidade de reposição do Planeta. Geralmente, quem administra as contas de casa sabe, desde sempre, que, se gastar mais do que ganha, um dia, o cheque especial, com seus juros dignos de estelionatários mafiosos, irá engoli-lo.
Infelizmente, por mais evidências acumuladas, por mais estudos comprovando que somos uma das causas para a aceleração do atual processo de mudança climática, seja ela natural ou não, a humanidade, principalmente a que tem poder de mudança, continua apagando incêndio com gasolina. Falando em incêndio, o Planeta, na atual temporada, continua ardendo no Brasil, Rússia, Malásia e por tantos outros lugares onde a ficha ainda não caiu.
Os governos preferem continuar pensando de quatro em quatro anos, pois é isso que interessa aos representantes, eleitos por uma sociedade que também parece silenciosa e apática diante do monstro que alimentamos e que irá nos engolir. A incompatibilidade desse raciocínio político de fundo de quintal não se articula, de forma alguma, com a necessidade de políticas de estado e internacionais, permanentes quando o assunto é ambiente, tema que exige um horizonte de décadas.
Destaco que, no “meu quintal”, eu investi 30 anos de minha vida terrena para a recuperação e gestão dos manguezais da lagoa Rodrigo de Freitas. A lagoa que encontrei, nos anos 80, como um depósito de peixes mortos e esgoto e que, após três décadas de inúmeras batalhas, se apresenta em melhores condições ambientais e com uma biodiversidade revigorada.
O fim está próximo, pelo menos para o maior passivo ambiental da cidade do Rio, o sistema lagunar de baixada de Jacarepaguá /Foto: Olho Verde/Mario Moscatelli
Quem quiser se envolver nesse tema precisa entender que a destruição vem de forma quase que imediata. De forma diametralmente oposta, qualquer ação de recuperação exige esforços de décadas. Aí é que pega o problema num lugar como o Brasil, que tem uma cultura imediatista, carnavalesca, onde manutenção e gestão são palavrões tidos como blasfêmias. De qualquer forma, mais do que tudo, precisamos mudar nossos hábitos! Aí é que o bicho volta a pegar!
Indo ao supermercado hoje, além da quantidade de embalagens que você acaba comprando e que se transformará em lixo — visto que coleta seletiva continua uma miragem cultural e operacional na cidade do Rio — notei que, apesar da lei das sacolas plásticas, bem como da cobrança delas, a maioria das pessoas persiste no hábito de utilizá-las. Poucas ainda são as que utilizam as bolsas retornáveis, muito mais práticas e adequadas. De qualquer forma, a ficha parece que está começando a cair, lentamente, talvez lenta demais para evitarmos o pior.
Autor: Redação
Comentários para "Meio ambiente. “A ficha está começando a cair”":