MP do DF vê divergência em dados da Secretaria de Saúde. Áudio alimenta preocupação

Em áudio, gerente-geral de assistência do Hospital de Base afirma que a unidade está lotada. Iges-DF nega

MP do DF vê divergência em dados da Secretaria de Saúde. Áudio alimenta preocupação
MP do DF vê divergência em dados da Secretaria de Saúde. Áudio alimenta preocupação

Alexandre De Paula - Correioweb - 28/06/2020 08:40:15 | Foto: CorreioWeb

MP do DF vê divergência em dados

Dados obtidos pelo Correio mostram que equipes do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) verificou discrepância nos dados da Secretaria de Saúde. Em 4 de junho, as autoridades estiveram no Hospital de Base, onde 45 leitos de UTI com assistência ventilatória estavam ativos. Outros 20 estavam inativos e com equipamentos alugados pelo Instituto de Gestão Estratégica do DF (Iges) junto ao Hospital Maria Auxiliadora. Na data da vistoria, havia 25 pacientes internados nos leitos reservados para covid-19, porém, no site da Sala de Situação SES, consultado no mesmo dia, constavam apenas 16 internações. “Outra verificação foi a informação de 65 leitos disponíveis, sendo que 20 não estavam em condições para receber pacientes”, argumentou o MPDFT.


O Ministério Público também visitou o Hospital de Santa Maria, em 3 de junho. Dos 50 leitos de UTI existentes, 47 estavam prontos para o recebimento de pacientes e três encontravam-se desativados. No entanto, informações enviadas por ofício pela SES a MPDFT notificaram, cinco dias depois, sobre outros 12 leitos bloqueados por falta de técnicos de enfermagem naquele hospital. “Outros problemas foram verificados, como o fato de a médica rotineira da UTI, no momento da visita, não ter especialidade em terapia intensiva. A equipe assistencial da UTI do 1º andar, que é gerida pela empresa Domed, utilizava sistema eletrônico próprio para registro das informações clínicas, o que impossibilita o acesso desses dados pelos demais profissionais do hospital, do Iges-DF e da SES, além de dificultar a construção de boletins epidemiológicos. Também foram apontadas necessidades relacionadas a recursos humanos para viabilizar a capacidade total de atendimento na unidade e problemas na regulação dos leitos.”

Desabafo

O relato de uma médica que atua no pronto-socorro e na emergência do Hospital do Paranoá escancara a realidade vivida em outras unidades da rede pública. Ao Correio, a profissional, que preferiu não se identificar, conta que, há quase um mês e meio, a demanda de casos suspeitos começou a crescer, e é difícil deslocar os pacientes para o Hospital Regional da Asa Norte (Hran). “Eles não conseguiam receber todos os casos. Antes, a gente recebia um caso suspeito e já mandava, nem ficava muito tempo com o paciente. Depois, o Hran começou a pedir mais informações do paciente, como tomografia, até para frear a demanda”, detalha.


Sem local para isolar pacientes suspeitos, os mesmos tinham que dividir espaço com doentes não contaminados por covid-19. “Tem a sala vermelha, o box de emergência; ali deveria ser um local apenas para pacientes graves, mas começaram a colocar os suspeitos lá dentro. Chegou a um nível que a gente estava com dez pacientes dentro desse espaço, sendo oito suspeitos, e havia ali pacientes que não eram graves. A gente recebia os que estavam mais graves, com infarto, e eles têm que ficar na sala vermelha para serem monitorizados. Houve caso de o paciente entrar num local completamente contaminado, pelo simples fato de não haver um espaço específico para infectados com o coronavírus”, descreve. A médica, inclusive, chegou a perder um paciente devido a uma piora no quadro neurológico, pois ele teve contato com o vírus. “É muito difícil e triste”, desabafa.


O contexto atingiu um ponto no qual uma servidora, diante da não resolução do problema, isolou um espaço na própria enfermaria para atender casos do novo coronavírus. Duas semanas depois, a direção oficializou a área. Hoje, a médica afirma que a situação melhorou, mas que ainda é muito difícil encaminhar pacientes para o Hran. “É uma ilusão achar que a gente não vai ficar com o paciente”, acrescenta. Na avaliação dela, ao contrário do aumento da demanda dos pacientes, que de um mês para o outro quase triplicou, a resposta ao problema demorou, e aconteceu por pressão dos servidores. “Em março, atendi, no plantão, a uns três pacientes suspeitos. No final de abril, começo de maio, teve um plantão que intubei três pacientes. Há umas duas semanas, o box estava com oito pessoas, sendo cinco intubados e todos suspeitos. É importante conhecer a realidade de uma emergência, de um pronto-socorro, o funcionamento no dia a dia para tomar as melhores decisões”.

Áudio alimenta preocupação

Um áudio gravado, ontem, pelo gerente-geral de assistência do Hospital de Base do Distrito Federal, Lucas Seixas, à equipe dele, na unidade, destacou a possibilidade de esgotamento do sistema de saúde local. Na mensagem, ele também defendeu o lockdown. A gravação, a que o Correio teve acesso, vazou e aumentou a preocupação sobre a capacidade de atendimento no DF.


A Secretaria de Saúde garantiu que não há lotação. À tarde, o próprio médico aliviou o tom e afirmou que a preocupação era em relação à falta de oferta de insumos, e assegurou que, atualmente, não há desabastecimento. “Eu quero lhes informar que o Hospital de Base está 100% lotado; o Hran, 100% lotado; Santa Maria, 100% lotado. Na realidade, o grande problema, também, é falta de medicamento”, dizia o médico. “Pela velocidade, nós vamos ter um esgotamento em breve.”

Na mensagem enviada à equipe, ele afirmava, também, que a situação será difícil nos próximos dias e que foi encaminhada sugestão de lockdown para o GDF. Em entrevista ao Correio, Seixas afirmou, porém, que o problema não é restrito ao DF, e que a preocupação é com a falta de insumos, como sedativos, nas próximas semanas. Ele assegurou que, atualmente, não há desabastecimento. “Não tem onde comprar pela falta de oferta mundial. É algo que está acontecendo no mundo inteiro. Se não diminuirmos o fluxo de pacientes, não adianta ter dinheiro, nem adianta nada, porque o que falta é matéria-prima”, disse.


O áudio, disse Seixas, era voltado para a própria equipe. “Foi uma ordem aos meus subordinados para economizar, racionalizar, porque está tendo falta mundial. Em 15 dias, podemos ter colapso em virtude disso”, justificou. “Quero deixar claro que esse problema dos medicamentos não depende do Iges, da Secretaria ou do GDF.”

Ao Correio, o governador Ibaneis Rocha afirmou que desconhece o áudio citado e, questionado sobre a análise de lockdown, declarou que não tratou desse assunto. Na última sexta-feira, o GDF analisava a possibilidade de decretar lockdown em todo o DF, até segunda-feira, para tentar conter o avanço da covid-19. Após a chegada de mais 150 respiradores, no entanto, Ibaneis declarou que o estudo foi suspenso. Por meio de nota oficial, o Iges-DF afirmou que os dados divulgados no áudio não procedem e afirmou que não há ocupação total de leitos nas unidades citadas. “Apesar de as liberações desses leitos serem dinâmicas, o Iges-DF estuda meios de poder disponibilizar mais vagas para atender um número maior de pacientes e dar mais suporte à rede pública de saúde do DF”, diz o texto. (Colaboraram Walder Galvão e Roberta Pinheiro

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