O feriado foi instituído por decreto de setembro de 1924, pelo então presidente Arthur Bernardes
Cristiane Gercina, São Paulo, Sp (folhapress) - 01/05/2025 09:54:59 | Foto: Letycia Bond/Agência Brasil
Manifestações pela redução da jornada de trabalho marcaram a origem do 1º de Maio no Brasil e no mundo. Passados cem anos da instituição da data como Dia do Trabalho, a diminuição da jornada ainda é a pauta principal, com movimentos pelo fim da escala 6x1.
O feriado foi instituído por decreto de setembro de 1924, pelo então presidente Arthur Bernardes, determinando que, a partir de 1º de Maio de 1925, o dia fosse "consagrado à confraternidade universal das classes operárias e em comemoração dos mártires do trabalho".
Segundo historiadores, essa era uma tentativa institucional de diminuir a força dos movimentos socialistas nas fábricas brasileiras, após a vinda de imigrantes europeus -especialmente italianos e espanhóis- que já tinham histórico de lutas trabalhistas no processo de industrialização de seus países de origem.
De acordo com o professor Ruy Braga, sociólogo do trabalho e docente do Departamento de Sociologia da USP (Universidade de São Paulo), não há como se falar em 1º de Maio no Brasil sem remontar às origens da data em todo o mundo.
"A ideia do 1º de Maio como um dia de protesto de trabalhadores que historicamente reivindicam jornadas de trabalho mais curtas e, ao mesmo tempo, condições de vida e de salário melhores, é algo que remonta ao final do século 19", diz.
Segundo ele, é preciso voltar a 1866 quando, na cidade de Baltimore (EUA), o Sindicato Nacional dos Trabalhadores (National Labor Union) realizou um congresso em agosto, definindo que a principal reivindicação seria por uma jornada de trabalho de oito horas diárias a ser instituída por lei.
Anos depois, sem que a jornada fosse implementada, trabalhadores de Chicago organizaram uma greve, em 1º de Maio de 1886, que foi reprimida com violência policial, levando à morte de manifestantes.
A greve ganhou força após o ato de violência e, no dia 3 de maio daquele ano, novo protesto voltou a fazer deixar mortos, com a explosão de uma bomba matando trabalhadores e policiais. Estima-se que, em todo o país, as paralisações contra a repressão alcançaram 340 mil trabalhadores.
Segundo o juiz do trabalho e professor Guilherme Feliciano, também docente da USP, é preciso voltar ainda mais na história para entender as reivindicações pela redução da jornada: a Inglaterra do início do século 19. Foi ali, em 1802, o berço do que é considerada a primeira legislação trabalhista do mundo, a "Lei de Saúde e Moral dos Aprendizes" ou "Lei de Peel".
A lei impunha jornada menor para aprendizes, incluindo mulheres e crianças, que tinham jornadas de até 16 horas diárias nas indústrias têxteis, especialmente em Manchester, em fábricas sem ventilação.
"Em 1802, isso é percebido basicamente como problema de saúde pública, quando se nota que trabalhadores mais jovens estavam adoecendo aos borbotões, o que também era prejudicial do ponto de vista dos gastos do governo", diz.
As greves de trabalhadores passaram a ser então a forma de protesto por diminuição das horas diárias de trabalho, mas sempre reprimidas com violência.
"Hoje, falamos do direito de greve como um direito social fundamental, mas no século 19, movimentos grevistas eram fortemente criminalizados", afirma. "No Brasil, o Código Penal de 1940 ainda trata a greve como um delito grave", explica.
Mas foi na França, em 1919, que o 1º de Maio passou a ser Dia do Trabalho, com foco na reivindicação de uma divisão tripartite das 24 horas diárias, sendo oito destinadas ao trabalho, oito ao descanso e oito horas a lazer, família, convívio social, educação e o cuidado de si.
Tanto ele quanto Braga dizem que a apropriação do 1º de Maio pelo Estado no Brasil não vem apenas de Arthur Bernardes, mas também de Getulio Vargas, que implantou a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) em 1º de maio de 1943.
Motivados por uma preocupação semelhante com o potencial político da data, os Estados Unidos escolheram celebrar oficialmente o Dia do Trabalho (Labor Day) na primeira segunda-feira de setembro, e não em 1º de Maio, como no resto do mundo, numa tentativa de se distanciar de suas origens socialistas.
"No final das contas, o que aconteceu é que o 1º de Maio acabou ganhando oficialidade por conta da tradição francesa e o Labor Day nos Estados Unidos, na primeira segunda-feira de setembro, é uma escolha política e histórica", diz Feliciano.
Para Ricardo Patah, presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores) e do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, houve evolução da relação capital-trabalho após tantas mortes no Brasil e no mundo em busca de jornada menor.
Patah lembra a histórica greve de 1917, de operários de São Paulo, e a conquista da Constituição Federal de 1988, quando a jornada de trabalho brasileira caiu de 48 horas semanais para 44 horas.
"Agora, voltou novamente esse debate, principalmente pelas mudanças que têm ocorrido no mundo, com o surgimento da tecnologia. Essa nova redução da jornada se faz necessária. A sociedade clama", afirma.
A advogada Leticia Ribeiro, da área trabalhista do escritório Trench Rossi Watanabe, afirma que o 1º de Maio tem relevância para a sociedade por ser uma oportunidade de se refletir sobre "os desafios atuais nas relações modernas de trabalho e como melhor nos adaptarmos".
"O trabalho continua tão central em nossas vidas quanto no passado. Não é só uma questão econômica, tem dimensão social, popular e política. Ser reconhecido como um trabalhador em nossa sociedade não pode ser um desprestígio", diz.
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