Karina se aproximou de Eduardo Bolsonaro e, com a queda de Bebianno, assumiu os processos do presidente
Estadão Conteúdo - 27/10/2019 13:22:36 | Foto: Fundação Astrogildo
Em meados de abril de 2014, a advogada Karina Kufa , especializada em direito eleitoral, negociou seus serviços com a campanha de Alexandre Padilha (PT) ao governo de São Paulo. Ela fora indicada por Gabriela Araújo, esposa do tesoureiro nacional do PT, Emídio de Souza , de quem era colega em grupos de advogadas feministas. O partido considerou o pedido salarial de Karina alto demais e o negócio não prosperou.
Após quatro anos, a advogada paulista de 38 anos, mãe de dois filhos, estava no outro lado do espectro político – algo normal no direito eleitoral. Contratada pela campanha de Jair Bolsonaro à Presidência, tornou-se uma das colaboradoras mais próximas do presidente e foi parar no meio do fogo cruzado entre o Planalto e o PSL.
Dirigentes do partido, parlamentares e antigos colaboradores de Bolsonaro atribuem a Karina responsabilidade direta na crise que já se arrasta por mais de duas semanas. Segundo eles, a advogada ajudou a fazer a cabeça de Bolsonaro contra o presidente nacional do PSL, Luciano Bivar ; atua para afastar seus desafetos do círculo do poder e usa o fato de ter bom trânsito nos palácios de Brasília para exercer influência na capital.
Ela nega e diz que só defende seu cliente da melhor forma possível. “Estou na defesa do presidente da República e qualquer pessoa no meu lugar faria o mesmo”, disse ela ao Estado.
O nome de Karina surgiu no imbróglio entre o Planalto e o PSL no início do mês, quando uma peça com sua assinatura – representando Bolsonaro e dezenas de deputados do PSL – circulou na imprensa, sem que tivesse sido protocolada na Justiça. Ela exigia todas as informações de doadores e de receitas do partido , além de demandar que a direção da sigla informasse a existência de procedimentos internos para decidir como os recursos são aplicados.
Mas a participação da advogada na crise começou em fevereiro, com a queda do então secretário-geral da Presidência, Gustavo Bebianno . Karina foi parar na equipe de Bolsonaro pelas mãos do coordenador jurídico da campanha, Tiago Ayres, sobrinho do ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Ayres Britto, que fora contratado por Bebianno. Ayres precisava de alguém em São Paulo para acompanhar o andamento de um processo referente ao diretório estadual do PSL e se lembrou de um casal que conhecera em congressos de advocacia eleitoral, Amilton e sua esposa, Karina, e decidiu contratá-los.
Dias após a queda de Bebianno, Ayres foi dispensado por meio de uma mensagem de áudio em seu celular na qual Karina dizia que a partir de então os processos do presidente ficariam “concentrados” com ela.
Àquela altura Karina já havia se aproximado de Eduardo Bolsonaro e não dependia de intermediários para chegar ao núcleo do poder. De acordo com pessoas que acompanharam o processo, Bivar começou a se incomodar com os pedidos da advogada por contratos com o PSL, principalmente para fazer o compliance do partido.
Ao Estado, a advogada afirmou que apenas intermediou negociações de Bolsonaro com o vice-presidente do PSL, Antonio de Rueda, para tentar encontrar soluções às insatisfações do mandatário, sobretudo em relação a boas práticas.
Duas reuniões aconteceram no Palácio da Alvorada. Segundo uma fonte, Bolsonaro ignorou o compliance e começou a criticar o deputado Delegado Waldir, então líder do partido na Câmara. Conforme Kufa, o advogado Admar Gonzaga foi incluído para tocar o projeto de compliance interno e chegou a propor a refundação do partido, com a anuência de Rueda.
O auge da irritação de Bivar, segundo aliados, foi quando a senadora Selma Arruda (então no PSL e hoje no Podemos-MT) reclamou que Karina não comparecera ao tribunal para fazer a sustentação oral no julgamento no qual foi cassada por caixa dois e abuso do poder econômico. A partir de então, ele cobrou relatórios dos serviços da advogada. O Estado procurou Selma, mas não a achou. Kufa afirma que estava no tribunal, mas apenas um advogado fez a sustentação oral.
Relatórios. Depois disso, deputados começaram a passar uma lista na bancada do PSL que serviria de base para o documento assinado por Karina e revelado no início do mês. “ Luiz Philippe de Orleans e Bragança me ligou dizendo que mais de 30 deputados estavam insatisfeitos com Bivar”, disse a advogada. Adversários de Bolsonaro na disputa interna alegam que o documento serve para consolidar a narrativa de que a direção partidária persegue desafetos e não dá transparência às contas. O objetivo real seria abrir uma janela para que a ala bolsonarista da bancada possa deixar o partido sem perder os mandatos nem o Fundo Partidário.
Ao Estado, Kufa disse que há possibilidade de uma ação do tipo ter êxito. Segundo ela, o diretório nacional do partido descumpriu o estatuto ao não ter apresentado balanços mensais. “O estatuto fala que o diretório ( nacional ) tem que prestar contas mensalmente e, como houve essa ausência, podemos solicitar os documentos”, afirmou.
Pessoas próximas ao presidente avaliam que a estratégia pode ter levado Bolsonaro a uma armadilha jurídica e política. O estatuto do PSL o obriga a enviar uma prestação de contas anual à Justiça eleitoral, em abril, além de mandar balancetes mensais em anos de eleição, nos quatro meses anteriores e nos dois meses posteriores ao pleito. Perguntada sobre a acusação de que usa a proximidade com os Bolsonaros para se cacifar, Karina diz: “Sou uma profissional com respeito dos colegas de carreira muito antes de ser advogada dos Bolsonaros”.
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