Dados cruzados do Panorama do Mercado Global de Música, da Mordor Intelligence, com o estudo britânico ‘Black Lives in Music’ (BLiM), revelam um panorama amplo do cenário artístico.
Redação Com Informações De Assessoria - 26/11/2025 10:20:35 | Foto: Marcela Silva/Divulgação
Em meio a uma indústria que capta US$ 33 bilhões e cresce em 8% a.a (ao ano), segundo a Mordor Intelligence, o mercado da música tem mostrado que artistas negros conseguem transformar barreiras em protagonismo. Durante o Novembro Negro, mês dedicado à visibilidade e à valorização da cultura ‘afro’, as discussões sobre desigualdade e oportunidades na música vem ganhando destaque no país.
No começo da década, o estudo britânico ‘Black Lives in Music’ (BLiM), em parceria com a Opinium Research, revelou que 88% dos profissionais negros na música concordam que há barreiras na progressão de carreira. A amostragem feita no Reino Unido evidenciou que, mesmo com a expansão do mercado, ainda existe uma longa caminhada para artistas afrodescendentes.
Enquanto o sonho de “viver da música” parece distante, é na cena independente que muitos talentos têm apostado suas fichas. Embora o streaming tenha aberto às portas para ‘new faces’, os artistas independentes ainda capturam, em média, 36% das receitas do setor; comparados à fatia de 65% das grandes gravadoras (Sony, Universal e Warner), segundo o último ‘Panorama do Mercado Global de Música’.
Apesar dos esforços de gravadoras e artistas independentes, um paralelo traçado com o estudo ‘Black Lives in Music’ mostra que 38% dos músicos profissionais negros obtêm 100% de sua renda da música, em comparação com 69% dos brancos; evidenciando a má distribuição dos recursos. O alerta chamou a atenção de profissionais e gestores de talentos, como a empresária Marcela Silva, que atualmente gerencia as carreiras dos cantores Zai (MPB), Cinara (R&B) e atua como booker da SAMBAIANA.
“Se olharmos para a última meia década, o que mais chama atenção é o protagonismo da arte negra, cada vez mais presente e contundente na cena. Apesar dos desafios desta indústria bilionária, que ainda coloca barreiras raciais para o topo da carreira, vemos a ascensão de artistas e profissionais pretos que dialogam com suas comunidades, conquistam nichos e transformam o mainstream, desde os fenômenos da MTV até os dias de hoje. O incentivo da cena independente vem sendo um pilar dessa transformação, mas as estratégias usadas para conquistar o público também mudou”, explica.
Para Marcela, o amadurecimento da cena independente tem revelado um ‘novo perfil’ dos artistas, incentivado pelo protagonismo negro. Ela explica que a construção de reputação se tornou um ativo tão valioso quanto a própria obra, à fim de superar os desafios do mercado. “Entender o público, investir em propósito e planejar o discurso são etapas que sustentam carreiras de longo prazo e fortalecem a presença de novos nomes no cenário musical”, aconselha.
A gestora cultural, aos 39 anos, observa que esse movimento tem ganhado força entre artistas que se expressam a partir de suas origens e referências culturais. “A identidade deixou de ser apenas estética e passou a ser um símbolo de diferenciação e autenticidade. E a comunidade negra abraçou essa conduta artística como ninguém. O resultado? Protagonismo negro na cena independente. Reputação e autonomia artística como nenhuma outra cena. Assumir essa estética causou uma identificação, e é aí que nos vimos conquistados por eles”, comenta.
Nos últimos anos, Marcela tem observado o próprio mercado refletir essa mudança, com a ascensão de artistas negros que transformaram suas narrativas em projetos sólidos e independentes. Nomes como Cinara, Liniker, Xênia França, BK’ e Duquesa, que têm furado a bolha do trap, conquistando o pop e a cena global, exemplificam um modelo de carreira que se apoia na verdade artística e na autonomia, segundo a especialista.
Esse protagonismo ganha ainda mais relevância em períodos como o Novembro Negro, quando a cultura se torna vitrine de resistência, inspiração e pertencimento. “O Novembro Negro reforça a importância de reconhecer o impacto da arte produzida por artistas pretos na formação do que consumimos. Da letra ao som, junto às performances, eles carregam um pedaço da história e da identidade coletiva que se aproxima ao novo público”, revela.
A especialista destaca que o mercado da música vive uma transição decisiva. Por anos, a construção de imagem foi pautada pela estética do consumo de “artistas moldados”, para caber em estratégias de visibilidade. No entanto, a empresária afirma que os novos consumidores buscam discurso alinhado à verdade e ao pertencimento.
“O artista contemporâneo precisa representar algo além de um hit: ele precisa ter propósito, coerência e identidade. O consumo musical deixou de ser apenas sobre o ‘som’, e passou a ser um símbolo social. Essa virada é impulsionada por movimentos culturais como o AFROPUNK, que transformou o palco em um território de afirmação estética e política. Lá, a autenticidade não é tendência, é o princípio. Dentro desse cenário, a gestão de carreira se torna também gestão de sentido. Não basta vender shows; é preciso construir presença, narrativas e reputação. O futuro do entretenimento está na interseção entre ‘arte’ e ‘verdade’; e quem compreender isso primeiro, ditará o novo tempo da música brasileira”, conclui.
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