Entre os dias 7 e 14 de setembro, representação do Icomos visitou o Teatro Amazonas, em Manaus, e o Theatro da Paz, em Belém
Agencia Gov | Via Iphan - 18/09/2025 10:46:55 | Foto: Fotos: Oscar Liberal/Iphan
O Brasil cumpriu mais uma etapa do processo que pode colocar os dois maiores estados da Região Norte no mapa do Patrimônio Mundial Cultural. Entre 7 e 14 de setembro, uma representação do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos) visitou as cidades de Manaus e Belém para avaliar in loco o Teatro Amazonas e o Theatro da Paz. A entidade é associada à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Símbolos monumentais da história e da cultura da região, os dois teatros são candidatos à Lista do Patrimônio Mundial Cultural da Unesco, na qual o Governo Brasileiro pleiteia que sejam inscritos como um bem cultural conjunto: os Teatros da Amazônia.
Etapa essencial do processo de candidatura, a visita do Icomos foi organizada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em articulação com os governos do Amazonas e do Pará e as prefeituras das duas capitais. Por quatro dias em Manaus e quatro em Belém, a representação do Conselho observou elementos arquitetônicos e artísticos dos teatros, analisou documentos e acervos, assistiu a espetáculos e conversou com equipes técnicas e representantes da sociedade envolvidos com as duas casas, como artistas, produtores, educadores, agentes de turismo, empresários e comerciantes.
Também foram avaliadas as chamadas zonas núcleo (core zones) onde estão localizados os dois teatros – especialmente o Largo de São Sebastião, em Manaus, e o complexo formado pela Praça da República, Parque João Coelho e Praça da Sereia, em Belém –, bem como ruas e sítios próximos que integram as chamadas zonas de amortecimento (buffer zones), com áreas definidas no dossiê da candidatura entregue à Unesco em 31 de janeiro de 2025.
Tanto o aspecto urbanístico como o estado de conservação dessas zonas têm influência no relatório que será compartilhado com a unidade de avaliação do Conselho, cuja recomendação oficial sobre a candidatura deve ser apresentada à Unesco em março de 2026.
Novas cidades, novos valores
O fato de a avaliação especializada contemplar praças, ruas e sítios no entorno dos teatros ilustra aspecto importante do processo de reconhecimento, pela Unesco, de bens culturais candidatos a Patrimônio Mundial.
Como explica o diretor do departamento de Patrimônio Material e Fiscalização do Iphan, Andrey Schlee, o inegável valor arquitetônico dos dois prédios é apenas um dos atributos considerados pelo organismo internacional. Também são levadas em conta a implantação e a influência dos teatros no desenho urbano e na vida cultural de ambas as capitais, que, segundo Schlee, passaram por transformações econômicas e sociais semelhantes a partir do surgimento das duas casas.
Inaugurados em 1878 e 1896, respectivamente, o Theatro da Paz e o Teatro Amazonas representam um projeto de urbanização e modernização da região Amazônica.
“Se durante o período colonial, as cidades brasileiras eram marcadas por um núcleo composto por igreja e fortificação, a partir da segunda metade do século XIX, teatros como os da Amazônia, com suas praças amplas, passaram a ocupar um novo lugar central na urbe”, diz o diretor, que, junto a representantes dos governos estaduais e municipais de Manaus e Belém, acompanhou a representação do Icomos durante a visita aos teatros e aos largos, praças e ruas em seus entornos.
“Os teatros da Amazônia simbolizam a chegada de uma nova classe social burguesa, enriquecida pelo apogeu econômico derivado da extração da borracha, com novos valores”, diz Schlee. “Era uma classe influenciada pelos países europeus com os quais passam a dialogar intensamente, sobretudo por meio das águas dos seus rios.”
Nesse diálogo de mão dupla, diz ele, os teatros se caracterizam em monumentos que mesclam estéticas e materiais importados da Europa com matérias-primas e referências locais. É o que se nota em elementos como o uso de madeiras nativas, em pisos com ladrilhos colados com cola de gurijuba (espécie de peixe de cuja bexiga natatória é extraída a substância), em pinturas que remetem à fauna e à flora amazônicas ou na presença de bustos homenageando expoentes do romantismo brasileiro, como José de Alencar, Gonçalves Dias e Carlos Gomes.
São elementos como esses, preservados ainda, que ressaltam a autenticidade e a integridade dos dois teatros – critérios fundamentais na avaliação da candidatura a Patrimônio Mundial Cultural. E, como afirma o coordenador técnico do Iphan no Amazonas, o arquiteto Rafael Azevedo, "mesmo as adaptações feitas ao longo das décadas para garantir usos mais seguros e amplos dos dois teatros – como sistemas de combate a incêndio, equipamentos de audiodescrição, rampas e elevadores, por exemplo –, não descaracterizam seus atributos originais". O que não significa dizer que os Teatros da Amazônia são bens congelados no tempo, ao contrário.
Economia criativa
Concebidos como espaços de lazer de elite, casas de ópera imponentes no coração das duas metrópoles, os Teatros da Amazônia mantêm-se centrais na vida cultural de Belém e Manaus porque foram ressignificados ao longo do tempo, servindo hoje de palco e cenário tanto de espetáculos eruditos quanto de expressões contemporâneas das culturas populares amazônicas e brasileiras. E não foi diferente na visita do Icomos, que, entre as duas casas, assistiu desde orquestras, corais e balés até apresentações artísticas de grupos indígenas e dos bois Caprichoso e Garantido, figuras centrais para o Complexo Cultural do Boi Bumbá do Médio Amazonas e Parintins.
E esse é outro atributo, segundo o diretor do Iphan, Andrey Schlee, que faz toda a diferença na avaliação da Unesco. “Para ser reconhecido como Patrimônio Mundial, um bem tem de ser atualizado, se manter vivo. E os Teatros da Amazônia são. Equipamentos culturais como esses movimentam a economia criativa das duas cidades”, diz.
Não por acaso, a representação também foi convidada a conhecer o Liceu de Artes e Ofícios Claudio Santoro e a Central Técnica de Produção, em Manaus - instituições responsáveis, respectivamente, pela formação de novas gerações de artistas manauras que sonham em se apresentar no Teatro Amazonas e pela confecção de figurinos, cenários e adereços de cena para espetáculos da casa. Assim como, em Belém, também visitou equipamentos culturais, como o Instituto de Ciências da Arte da Universidade Federal do Pará (ICA/UFPA), em frente ao Theatro da Paz, na Praça da República, e a tradicional feira da praça, aos domingos.
Na opinião da chefe da Assessoria para Assuntos Internacionais do Iphan, Juliana Bezerra, a candidatura dos Teatros da Amazônia a Patrimônio Mundial Cultural amplia a representatividade cultural da Região Norte do Brasil no contexto internacional.
"A Unesco já reconhece o complexo de áreas protegidas da Amazônia Central - Parque Nacional do Jaú, Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã e Parque Nacional Anavilhanas - como Patrimônio Mundial Natural. E no âmbito da Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Imaterial da Humanidade, já há o Círio de Nazaré. Agora, a atual candidatura dos Teatros da Amazônia joga luz em um projeto de formação urbana e de novas centralidades nas cidades a partir da cultura, bem como difunde e promove a atuação de trabalhadores da cultura dessas duas importantes capitais do Norte."
Além de representantes do Iphan e das secretarias estaduais e municipais que têm relação com os dois teatros, também integraram a missão representantes do Ministério da Cultura (MinC) e do Ministério das Relações Exteriores (MRE), órgãos que, junto ao Iphan, representarão o Brasil na 48a sessão do Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco, marcada para julho de 2026, quando a candidatura , caso os passos obrigatórios sejam devidamente cumpridos, será julgada.
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