Os astronautas Scott Kelly e Kjell Lindgren experimentam a alface romana vermelha: de 33 a 56 dias para a colheita
Correioweb - 07/03/2020 08:22:07 | Foto: CorreioWeb
Horta espacial
Folhas de alface são plantadas e colhidas a mais de 400 quilômetros da Terra. Segundo os cientistas, elas são seguras para o consumo humano e têm propriedades semelhantes às produzidas de forma tradicional
No cardápio do espaço, não tem alimentos frescos. Em missões tripuladas, os astronautas comem as chamadas rações pré-embaladas. Nozes, chocolate, manteiga de amendoim, carne e frango estão entre as opções processadas. Esses “pratos” são submetidos a procedimentos — geralmente por aquecimento e irradiação — para durarem mais tempo. Apesar da facilidade, a agência espacial americana, a Nasa, tem buscado soluções para deixar as refeições mais naturais. Uma equipe do Centro Espacial Kennedy descreve, na edição da hoje da revista Frontiers in Plant Science, como tem avançado nesse sentido. Eles conseguiram cultivar alface a bordo da Estação Espacial Internacional (ISS).
A mais de 400 quilômetros da Terra, a plantação de alface romana vermelha não perde em propriedades para a horta tradicional. Segundo os cientistas, as folhagens espaciais são livres de micróbios causadores de doenças, seguras para comer e pelo menos tão nutritivas quanto as terrestres. Isso mesmo tendo crescido sob menor gravidade e radiação mais intensa. O cultivo se deu “sem perturbações” por 33 a 56 dias, até que Scott Kelly, Kjell Lindgren e outros membros da tripulação comeram parte das folhas maduras — eles congelaram uma parte do cultivo para ser examinada na Terra.
Segundo Christina Khodadad, coautora do estudo, o resultado promissor serve de estímulo para planos ainda mais ousados. A Nasa planeja usar a prática nas próximas missões Artemis-III (programadas para pousar seres humanos no polo sul lunar até 2024) e na primeira missão tripulada a Marte (planejada para o fim da década de 2020).
“A capacidade de cultivar alimentos em um sistema sustentável e seguro para o consumo da tripulação se tornará crítica à medida que a Nasa avançar para missões mais longas. Os vegetais folhosos do tipo salada podem ser cultivados e consumidos frescos com poucos recursos”, detalha Khodadad.
Suplemento natural
A semelhança nutritiva com as alfaces cultivadas na Terra resolve outros problemas. As folhagens espaciais forneceram aos astronautas potássio adicional, além de vitaminas K, B1 e C, nutrientes que são menos abundantes nas rações pré-embaladas e tendem a se degradar durante o armazenamento a longo prazo.
Como controle, os cientistas cultivaram alfaces na Terra sob as mesmas condições do espaço. Isso foi possível porque os dados de temperatura, dióxido de carbono (CO2) e umidade foram registrados na ISS e replicados nos laboratórios do Centro Espacial Kennedy.
Em praticamente todos os ensaios, as alfaces de lá foram semelhantes em composição às daqui, sendo que as espaciais tenderam a ser mais ricas em potássio, sódio, fósforo, enxofre e zinco, assim como em moléculas com atividade antiviral, anticâncer e anti-inflamatória. Ambas as folhagens apresentaram níveis parecidos de antocianina e outros antioxidantes que podem proteger as células de danos causados por radicais livres.
Micróbios
Ao examinar as comunidades microbianos presentes nos dois tipos de plantações, a equipe teve outra surpresa: a diversidade e a identidade de micro-organismos também eram muito parecidas. Dadas as condições únicas da ISS: os cientistas esperavam que elas favorecessem o desenvolvimento de comunidades microbianas distintas.
Segundo Christina Khodadad, nenhum dos gêneros de bactérias detectados é conhecido por causar doenças em seres humanos. Testes adicionais confirmaram que as alfaces não continham micro-organismos que ocasionalmente contaminam as culturas, como Escherichia coli, Salmonella e Staphylococcus aureus, enquanto o número de esporos de fungos e bolores também estava na faixa normal para o consumo humano.
A lista extensa de resultados positivos encoraja a equipe a pensar em experimentos com outras culturas nutritivas a bordo da ISS. “A Estação Espacial Internacional está servindo como banco de ensaio para futuras missões de longa duração, e esses tipos de testes de crescimento de culturas estão ajudando a expandir o conjunto de candidatos que podem ser efetivamente cultivados em microgravidade. Testes futuros vão estudar outros tipos de culturas, como pimenta e tomate, para ajudar a fornecer produtos frescos suplementares para a dieta dos astronautas”, adianta Gioia Massa, cientista do projeto no Centro Espacial Kennedy e coautora do estudo.
"Testes futuros vão estudar outros tipos de culturas, como pimenta e tomate, para ajudar a fornecer produtos frescos suplementares para a dieta dos astronautas”
Gioia Massa, cientista do Centro Espacial Kennedy e participante do estudo
Turismo será retomado
A empresa americana SpaceX anunciou que, no ano que vem, enviará três turistas à Estação Espacial Internacional (ISS), algo que não acontece há 11 anos. A companhia de Elon Musk firmou parceria com a Axiom Space para ceder vagas a bordo da cápsula Crew Dragon. A viagem deve ocorrer no segundo semestre e “estabelecerá um marco na marcha rumo ao acesso de rotina e universal ao espaço”, segundo o presidente executivo da Axiom Space, Michael Suffredini. Oito turistas espaciais já viajaram à ISS, nos foguetes russos Soyuz. O primeiro, em 2001, foi o empresário americano Dennis Tito, que pagou US$ 20 milhões pela experiência. O valor da próxima viagem não foi divulgado.
Tubo de ensaio
Fatos científicos da semana
Segunda-feira, 24
Vaticano abre arquivos de Pio XII à pesquisa
Historiadores tiveram acesso aos arquivos do pontificado do papa Pio XII (1930-1958), acusado de permanecer calado durante o extermínio de seis milhões de judeus. Mais de 200 pesquisadores se inscreveram para o evento, considerado histórico. “A Igreja não tem medo da História”, afirmou o papa Francisco ao decidir, há um ano, abrir o cobiçado acervo. “Para milhões de pessoas, católicas e judias, esses arquivos são de enorme interesse humanitário”, destacou Suzanne Brown-Fleming, diretora de programas internacionais do Museu Memorial do Holocausto dos Estados Unidos, que iniciou um mergulho de três meses na documentação. Também foram abertos pela primeira vez os arquivos do longo período pós-guerra, principalmente os relativos à censura de escritores e padres próximos do comunismo.
Terça-feira, 3
Ararinhas-azuis de volta a seu habitat
Um lote de 50 ararinhas-azuis desembarcou no Brasil, proveniente da Alemanha. Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), trata-se de uma tentativa de devolver a espécie, que sobrevive apenas em cativeiro, ao seu habitat. As aves fizeram uma escala em Pernambuco antes de seguirem viagem à pequena cidade de Curaçá, na Bahia, de onde a espécie é considerada natural e onde foi construído um centro de reprodução. As aves vão passar por uma quarentena de 21 dias. Passado esse período, um grupo, cujo número ainda não foi determinado, será liberado e outro será mantido em cativeiro.
Quarta-feira, 4
Previsões pessimistas para florestas tropicais
Estudo publicado na última edição da revista científica Nature alerta: as florestas tropicais estão perdendo a capacidade de absorção de CO2, e a Floresta Amazônica pode até produzir mais do que captura nos próximos 15 anos. Essas conclusões, advertem os pesquisadores, devem levar a medidas mais rigorosas em termos de emissões de CO2, de modo que a população mundial expulse menos dióxido de carbono, se quisermos cumprir os objetivos do Acordo de Paris, que limita o aumento da temperatura média global a menos de 2°C. Atualmente, 50% da capacidade de absorção de dióxido de carbono recai sobre florestas tropicais, elas estariam próximas da saturação, principalmente devido ao aumento de emissões causadas pela ação humana.
Quinta-feira, 5
Perseverance, o novo rover da Nasa em Marte
A agência especial norte-americana, a Nasa, anunciou o nome do quinto veículo de exploração espacial que levará a Marte: Perseverance. O novo rover estará equipado com os mesmos pneus que o Sojouner (que chegou ao Planeta Vermelho em 1997), Spirit e Opportunity (2004), assim como a Curiosity, que explora o corpo celeste desde 2012. O nome foi escolhido em uma competição nacional, e formalizado em uma escola em Burke, no estado americano da Virgínia, onde estuda o aluno que fez a sugestão. “A proposta de Alez captou o espírito de exploração”, disse Thomas Zurbuchen, cientista chefe da Nasa. “Assim como qualquer missão exploratória do passado, Perseverance enfrentará desafios e fará descobertas excepcionais”, acrescentou.
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