Dados da sonda Maven ajudam a entender como Marte se tornou um local inóspito
Paloma Oliveto-correio Braziliense - 15/12/2019 09:48:25 | Foto: Correio Braziliense
Pesquisadores criaram o primeiro mapa da circulação dos ventos superiores na atmosfera de um planeta além da Terra, usando dados da sonda Maven, da Agência Espacial Norte-Americana (Nasa), coletados nos últimos dois anos. O mapeamento dos ventos de Marte ajuda a entender melhor o funcionamento do clima do nosso vizinho, revelando, também, uma imagem mais precisa do passado remoto e da contínua evolução do planeta. Os ventos atmosféricos superiores estão nas termosferas planetárias — áreas em que a temperatura aumenta com a altura.
Maven, a missão Atmosfera de Marte e Evolução Volátil, comemorou recentemente o aniversário de cinco anos de sua entrada em órbita, ao redor do Planeta Vermelho, em 21 de setembro. O objetivo científico primário da missão é estudar o que resta da atmosfera para determinar como, em um passado distante, um Marte coberto de oceano e potencialmente habitável se tornou o lugar seco e desolado que é hoje. Estudar a atual atmosfera marciana — a taxa em que ela está sendo perdida no espaço e como e por que está sendo removida — fornece pistas com as quais espera-se montar o quebra-cabeça das atmosferas planetárias, incluindo a terrestre.
Dados da sonda Maven ajudam a entender como Marte se tornou um local inóspito
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“Os ventos observados na atmosfera superior de Marte, às vezes, são semelhantes aos que vemos nas simulações globais de modelos, mas outras vezes podem ser bem diferentes”, afirma Kali Roeten, pesquisador da Universidade de Michigan. “Esses ventos também podem ser altamente variáveis na escala de horas, mas, em outros casos, são consistentes durante todo o período de observação.” Roeten é o principal autor de um artigo sobre essa pesquisa, publicado no Journal of Geophysical Research-Planets.
Ondas de rádio
Os ventos atmosféricos superiores na Terra já foram mapeados em detalhes. Eles conduzem uma série de processos na atmosfera que podem afetar a propagação de ondas de rádio, que são cruciais para fins de comunicação daqueles que estão na superfície, e a previsão de caminhos que os satélites seguirão em sua órbita ao redor da Terra.
O mapeamento dos ventos marcianos, portanto, é um passo crucial para a compreensão das características das atmosferas extraterrestres, além do que já se sabe a respeito dos processos na Terra.As medidas mapeadas em Marte foram obtidas a uma altitude de cerca de 140-240 quilômetros acima da superfície do planeta.
Mundos áridos
Estudo da composição química atmosférica de 19 exoplanetas com temperaturas e tamanhos diversos indica a presença de vapor d%u2019água - elemento essencial à vida -, mas em quantidades muito inferiores às estimadas anteriormente
Paloma Oliveto
Concepção artística de um exoplaneta orbitando sua estrela-mãe: H20 menos abundantes que de outros elementos |
A descoberta, em setembro, de vapor d’água em uma “Super Terra”, planeta rochoso fora do Sistema Solar e com temperatura semelhante à terrestre, aumentou a esperança de, um dia, se encontrar alguma forma de vida no Universo. Porém, no maior estudo realizado até agora sobre a composição química das atmosferas dos exoplanetas, cientistas europeus constataram que, embora contenham moléculas de H2O, elas não são abundantes nesses outros mundos, o que pode, ao menos na teoria, ser um impedimento para a existência de formas extraterrestres. O artigo foi publicado na revista Astrophysical Journal Letters.
Liderados pela Universidade de Cambridge, os pesquisadores usaram dados atmosféricos de 19 exoplanetas para obter medições detalhadas de suas propriedades químicas e térmicas. Os planetas explorados variam bastante de tamanho: vão desde “miniNetunos”, com quase 10 massas terrestres, a “SuperJúpiteres”, que ultrapassam 600 vezes a massa da Terra. As temperaturas também são diversas: em alguns deles, a média é de 20ºC; em outros, mais de 2 mil graus Celsius. Assim como nos gigantes que giram em torno do Sol, as atmosferas dos mundos estudados são ricas em hidrogênio, embora eles orbitem diferentes tipos de estrelas. Segundo o artigo, o levantamento “revela tendências que desafiam as teorias atuais da formação de planetas e têm implicações para a busca de água fora do Sistema Solar”.
Os pesquisadores descobriram que o vapor d’água é comum na atmosfera de muitos exoplanetas. Contudo, as quantidades são surpreendentemente menores do que se esperava, ao mesmo tempo em que as de outros elementos parecem consistentes com as expectativas. O estudo faz parte de um programa de pesquisa de cinco anos sobre as composições químicas das atmosferas planetárias fora do Sistema Solar. “Estamos vendo os primeiros sinais de padrões químicos em mundos extraterrestres e o quão diversos eles podem ser em termos de composição química”, diz o líder do projeto, Nikku Madhusudhan, do Instituto de Astronomia de Cambridge, que mediu, pela primeira vez, há cinco anos, a abundância de vapor d’água em exoplanetas gigantes.
No Sistema Solar, a quantidade de carbono em relação à de hidrogênio na atmosfera de planetas gigantes é significativamente maior que a do Sol. Pensa-se que essa abundância tenha se originado quando os planetas estavam sendo formados, e grandes quantidades de gelo, rochas e outras partículas foram trazidas para o planeta em um processo chamado de acréscimo. Os cientistas acreditam que a presença de outros elementos também seja alta em exoplanetas gigantes — especialmente o oxigênio, que é o mais abundante no Universo, depois do hidrogênio e do hélio. Isso significa que também se espera que a água, rica em oxigênio, seja superabundante nas atmosferas desses mundos.
Os pesquisadores usaram dados espectroscópicos (que captam assinaturas moleculares) coletados por telescópios espaciais e terrestres, incluindo o Telescópio Espacial Hubble, o Telescópio Espacial Spitzer, o Very Large do Chile e o Gran Telescópio Canarias, na Espanha. A gama de observações disponíveis, com modelos computacionais detalhados, métodos estatísticos e propriedades atômicas de sódio e potássio, permitiu estimar as abundâncias químicas nas atmosferas de exoplanetas em toda a amostra.
Raridade
A equipe relatou a quantidade de vapor d’água em 14 dos 19 planetas, e a de sódio e potássio em seis planetas. Os resultados sugerem uma depleção de oxigênio em relação a outros elementos e fornecem pistas químicas sobre como esses exoplanetas podem ter se formado, sem acúmulo substancial de gelo. “É incrível ver esses níveis baixos de água nas atmosferas de tantos tipos de planetas orbitando uma variedade de estrelas”, observa Madhusudhan. “Medir a abundância desses produtos químicos em atmosferas exoplanetárias é algo extraordinário, considerando que ainda não conseguimos fazer o mesmo com planetas gigantes em nosso Sistema Solar, incluindo Júpiter, nosso vizinho gigante mais próximo”, diz Luis Welbanks, autor principal do estudo e aluno de doutorado do Instituto de Astronomia de Cambridge.
De acordo com Welbanks, vários esforços para medir a água na atmosfera de Júpiter, incluindo a atual missão Juno, da Agência Espacial Norte-Americana (Nasa), se mostraram desafiadores. “Como Júpiter é muito frio, qualquer vapor de água em sua atmosfera seria condensado, dificultando a medição. Se a água em Júpiter for considerada abundante, como previsto, isso implicaria que se formou de maneira diferente dos exoplanetas que examinamos no presente estudo.”
“Estamos ansiosos para aumentar o tamanho da amostra de exoplanetas em estudos futuros”, conta Madhusudhan. “Nossos resultados mostram que diferentes elementos químicos não podem mais ser considerados igualmente abundantes em atmosferas planetárias, desafiando suposições em vários modelos teóricos. E, dado que a água é um ingrediente essencial para a nossa noção de habitabilidade na Terra, é importante saber quanto dela pode ser encontrado em sistemas planetários além do nosso.”
"Dado que a água é um ingrediente essencial para nossa noção de habitabilidade na Terra,
é importante saber quanto dela pode ser encontrado em sistemas planetários além do nosso”
Nikku Madhusudhan,
líder do projeto e cientista do Instituto de Astronomia de Cambridge
Para saber mais
Maior precisão
Como só se conhece por vida a que se tem na Terra, a busca por vizinhos no Universo precisa ser restrita ao que se chama de zona habitável: uma distância adequada da estrela que o planeta orbita, garantindo uma temperatura nem muito quente, nem muito fria, e propícia à existência de água líquida. “Nós precisamos entender o ambiente espacial de um planeta para entender se ele é habitável. Se ele orbita uma estrela muito ativa, isso pode colocar em risco sua atmosfera, o que é necessário para fornecer água líquida. Mas há uma linha tênue: há indicação de que a radiação de uma estrela pode produzir os blocos construtores de vida”, conta a astrofísica Katherine Garcia-Sage, do Centro de Voos Espaciais Goddad, da Nasa.
Embora instrumentos muito mais poderosos que o supertelescópio espacial Kepler, aposentado no ano passado, estejam a caminho, por enquanto não há como fazer a análise direta da possibilidade de um exoplaneta ser habitável. Por isso, os cientistas precisam lançar mão de diversos métodos para tentar identificá-los. Um deles é a construção de modelos computacionais que simulam a aparência de um astro com potencial de conter vida, e a forma como ele interage com sua estrela.
A partir de 2020, quando equipamentos mais sofisticados, como o telescópio Wfirst, da Nasa, deverão entrar em ação, a expectativa é de que se obtenha mais detalhes — com grande precisão — desses planetas. O instrumento, idealizado para uma missão de seis anos, será capaz de detectar assinaturas de oxigênio e vapor d’água, entre outras indicações de vida em potencial. Será possível, então, desenvolver modelos mais complexos. Atualmente, essa detecção não é feita diretamente, mas por meio de espectrômetro de massa, um equipamento que faz essas inferências, mas é localizado na Terra. (PO)
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