Não vou construir nenhum projeto que afronte STF, diz Paulinho após mudar anistia para dosimetria

O deputado já havia afirmado que o projeto tratará de redução de penas e não de anistia, conforme desejam o presidente da Câmara

Não vou construir nenhum projeto que afronte STF, diz Paulinho após mudar anistia para dosimetria
Não vou construir nenhum projeto que afronte STF, diz Paulinho após mudar anistia para dosimetria

Carolina Linhares, Brasília, Df (folhapress) - 19/09/2025 18:29:56 | Foto: © JOSÉ CRUZ/AGÊNCIA BRASIL

O relator do projeto de anistia aos condenados por atos golpistas, deputado Paulinho da Força (SP), que é presidente do Solidariedade, afirma que seu texto não irá afrontar o STF (Supremo Tribunal Federal).

"Eu não vou construir nenhum projeto que afronte o Supremo. Eu sou o maior defensor do Supremo no Tribunal Federal", diz à reportagem.

O deputado já havia afirmado que o projeto tratará de redução de penas e não de anistia, conforme desejam o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e os partidos do centrão.

Ou seja, em vez de prever o perdão aos condenados do 8 de Janeiro e ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o texto vai alterar o Código Penal para reduzir penas previstas para os crimes de golpe de Estado e abolição violenta do Estado democrático de Direito.

Paulinho diz que o projeto envolve um pacto com o STF e com o Poder Executivo, como já havia revelado a Folha de S.Paulo, no sentido de que pautas do interesse do governo Lula (PT) sejam votadas em seguida e que a corte não invalide a medida declarando sua inconstitucionalidade.

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PERGUNTA - Como foi o encontro com Aécio Neves, Michel Temer e Hugo Motta na noite de quinta (18)?
PAULINHO DA FORÇA - A gente clareou bem de pôr um nome no projeto, que não é de anistia, é de dosimetria. Estamos discutindo redução de pena. Esse projeto pode pacificar o país, na medida em que a gente tente envolver os Poderes. É um projeto para superar esse momento de polêmica, de polarização, e cuidar da vida real e dos projetos que interessam ao país.

P - Por que optar por um projeto de dosimetria e não de anistia?
PF - Hugo Motta desde o início tratou disso quando pensou [em pautar] a urgência do projeto. Ele pegou um projeto que tratava de uma anistia branda, mas desde o início dizendo para as lideranças: esse projeto vai ser só para que a gente apresente outra redação. Não é uma opção minha. Já era um entendimento dos líderes da Câmara. Estou aqui representando certa opinião da direção da Câmara, especialmente do presidente.

P - Mas por que Motta quis assim?
PF - Porque o projeto de anistia já foi considerado inconstitucional pelo Supremo. Não dá para a Câmara agora querer reviver uma coisa, teria que ser uma PEC [proposta de emenda à Constituição] e fazer um confronto com o Supremo. Quando Hugo Motta me indicou, tinha um pouco essa intenção de alguém que tinha relação com o Supremo. E que iríamos trabalhar para pacificar o país.

P - O sr. falou que tem boa relação no STF. Temer falou em pacto com o STF e o Executivo. O que exatamente propõe esse pacto?
PF - O Temer tem uma ideia de que a gente podia tentar fazer um pacto com o Legislativo, o Judiciário e também o Executivo. Para que a gente pudesse votar o que interessa não só à Câmara, mas ao Brasil, ao governo. Por exemplo, o governo [Lula] está com o projeto da isenção do Imposto de Renda, com a PEC da segurança pública, que o país está um caos na segurança. Poderíamos, nesse pacto, incluir tudo isso. Ou seja, vamos votar isso [redução de penas] agora, vamos votar em seguida isso, votar aquilo.

O Poder Judiciário teria que entrar concordando com esse texto que estou trabalhando. O ideal seria ouvir as bancadas da Câmara no começo da semana que vem e, com um esboço de texto, até sugeri isso ao Hugo Motta, ele poderia procurar a direção do Supremo e apresentar o texto. E tentar sair com isso pacificado no STF também.

P - O Executivo participaria para destravar a pauta e o STF não declararia o texto inconstitucional?
PF - É, não seria um projeto de afronta ao Supremo. E o governo entraria nessa história na medida em que você vota projetos em que o governo tem interesse. Aí sim a gente pacifica os Poderes e o Brasil.

P - Mas limitar os deputados a votarem apenas um texto com o qual os demais Poderes concordem não é constranger o Legislativo?
PF - Não, por isso que vou me reunir com uma por uma das bancadas. Só vamos conversar com os demais Poderes quando houver o esboço do projeto.

P - Mas a Câmara só pode votar um projeto nos termos que o STF concorde...

PF - Acho que o Supremo tem essa tranquilidade de que eu não vou construir nenhum projeto que afronte o Supremo. Eu sou o maior defensor do Supremo no Tribunal Federal. Tudo que tentam fazer contra o Supremo, eu sou o primeiro a gritar.

P - Isso não é uma interferência do STF no que a Câmara está legislando?
PF - Não. Precisamos de um entendimento nacional. A maioria do povo brasileiro não aguenta mais essa polêmica. Eu não tenho como agradar a todos. Vai ficar gente gritando de um lado e do outro? Provavelmente vai. Nem Jesus Cristo agradou a todo mundo, então não vai ser eu que vou. Vou tentar. Se não conseguir, eu preciso agradar a maioria.

P - O sr. fala em pacificação, mas os bolsonaristas estão revoltados com essa mudança de anistia para dosimetria, eles não vão aceitar.

PF - Vamos conversar com todos. Eu liguei para Rogério Marinho (PL-RN) e Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Estou indo encontrar Ciro Nogueira (PP-PI). Falei com a turma do PT também. Vamos falar com todos e, depois, a gente pode dizer, olha, não concordaram.

Aquelas pessoas mais radicais sabem disso. Talvez, até para fazer um discurso para a turma deles, o cara fica radicalizando lá, mas ele no fundo sabe que essa possibilidade não existe. Na medida que o Supremo já declarou inconstitucional. O melhor é ter uma coisa no meio, que possa beneficiar aqueles que foram injustamente penalizados.

P - A votação expressiva de 311 deputados a favor da urgência não mostra que há maioria para uma anistia em si?
PF - A gente construiu essa maioria, não é uma coisa que caiu do céu. Somou gente que queria anistia geral e irrestrita e gente que quer uma coisa no meio. Talvez a grande maioria queira algo no meio.

P - Como responde à crítica de que cabe ao Congresso anistiar, mas não rever penas já aplicadas pelo Poder Judiciário? Que isso sim seria afrontar o STF?
PF - O Congresso pode mudar as leis. E vamos mudar as leis. Precisamos fazer isso pacificado nos Poderes, para que a gente não tenha conflito lá na frente.

P - O sr. tem a sinalização de que o STF concorda com essa sua proposta?
PF - Não, eu não conversei com o pessoal do STF. Hugo Motta deve estar conversando, porque presidentes sempre se falam. Se tivesse algum ruído, eu seria o primeiro a saber.

P - Então o sr. imagina que eles iriam aceitar esse projeto intermediário?
PF - Imagino que sim.

P - Por que o Solidariedade entrou com uma ação para dificultar impeachment de ministro do STF na semana em o sr. foi escolhido relator?
PF - Foi uma coincidência. Entrei com essa ação porque a lei que cassa ministro Supremo é muito confusa. Ela fala em [maioria] de dois terços. Não se sabe se é dois terços no plenário, se é dois terços para cassar. Entrei para que o Supremo pudesse esclarecer. Acho realmente que ministro do Supremo não pode ficar sendo ameaçado toda hora. É mais para modular aquilo e garantir que os ministros possam trabalhar com tranquilidade.

P - A proposta aventada no Senado seria a de reduzir penas, mas fazendo uma distinção entre quem executou atos golpistas e quem planejou ou comandou. Sua proposta não faz essa distinção e reduz as penas igualmente para todos, por quê?
PF - Não faz, mas acho que vai ter que fazer. Estive duas vezes com [o presidente do Senado] Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) conversando sobre essa ideia dele. Achei espetacular.

P - A gente pode esperar, então, uma redução de pena maior para quem executou e menor para quem comandou?
PF - É isso aí. Pessoas que passaram lá no meio do tumulto, tacou uma pedra, essas pessoas têm que ir para a casa e cuidar da vida, cuidar da sua família.

P - Se a redução de pena retroage para todos, inclui Bolsonaro?
PF - O projeto não é individualizado, é geral. Se Bolsonaro tiver alguma dessas penas que serão incluídas, com certeza a quantidade de anos que foi imputada a ele será reduzida.

P - Bolsonaro depende desse projeto para cumprir prisão domiciliar?
PF - Não. Isso é outra história. Esse projeto vai reduzir penas de todo mundo, inclusive do Bolsonaro. Ao ponto de ele ficar domiciliado? Acho que não. Depende dessa articulação que vou fazer a partir de segunda-feira (22) na Câmara.

P - A prisão domiciliar dele pode estar colocada expressamente no projeto?
PF - Pode estar, se a maioria concordar. Agora, acho que não tem clima para fazer isso na Câmara. O caminho para o Bolsonaro ficar em casa é outro [por sua idade e condição de saúde], não é pelo projeto.

P - A anistia é um pleito na Câmara há quase três anos, por que foi pautada agora? É uma fatura da aprovação da PEC da Blindagem, tem a ver com a eleição de 2026?
PF - Não, não tem a ver. Chegamos a um entendimento na Câmara de que a gente precisava pacificar o país e destravar a pauta. As pessoas estão discutindo, brigando. A gente precisa sair dessa discussão e ir para o mundo real.

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