Viramos marionetes de uma sociedade de pensamentos únicos, em que, para ser aceito, é preciso “mugir no mesmo tom da manada”.
Por Paulo Silvestre - Estadão Conteúdo - 27/01/2021 10:20:53 | Foto: Pixabay
Há uma piada que circula pelas redes sociais que diz que ninguém é tão popular quanto parece ser no Facebook, nem tão bonito quanto no Instagram, tão bem-sucedido quanto no LinkedIn ou tão sucinto quanto no Twitter. Brincadeiras à parte, você tem a sensação que as postagens nas redes sociais estão ficando muito parecidas umas com as outras?
Não é só pela ação do algoritmo de relevância, que joga na nossa cara apenas aquilo que se parece conosco. Isso é resultado de um fenômeno em que as pessoas querem agradar o outro a qualquer custo. Fazem isso para conseguir um emprego novo ou mais clientes, para brilhar no seu grupo de amigos ou pela necessidade da gratificação fugaz e às vezes patológica de receber “curtidas”.
Fica difícil ser feliz com essa compulsão em agradar, mesmo que, para isso, tenhamos que mentir sobre nós mesmos. E isso se manifesta com ainda mais força nas redes sociais, que premiam quem é raso, porém alinhado com a massa. Viramos marionetes de uma sociedade de pensamentos únicos, em que, para ser aceito, é preciso “mugir no mesmo tom da manada”.
Até onde vai essa loucura?
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Por exemplo, em outubro, a organização internacional Artigo 19 divulgou relatório que demonstra que o Brasil teve a maior queda no mundo na liberdade de expressão. Em 2009, o país somava 89 pontos em uma escala de 0 a 100 em liberdade de expressão. Em 2020, somamos apenas 46 pontos!
Com isso, ocupamos a modesta 94ª posição, entre 161 países avaliados, e deixamos de fazer parte do grupo de países classificados como “abertos”. Estamos praticamente empatados com as Filipinas, e abaixo da Hungria e do Haiti. Também estamos atrás de todos os países da América do Sul, exceto a Venezuela.
Algumas pessoas podem contestar esse número, dizendo que, no Brasil, nunca ouve tanta liberdade de expressão, graças às manifestações nas redes sociais. É preciso então explicar o que esse termo significa.
De fato, nunca tanta gente colocou seus pensamentos nas redes sociais. Mas isso não é suficiente para configurar liberdade de expressão. Na verdade, acaba sendo o contrário!
Primeiramente porque grande parte do que propagam são ataques baratos que visam destruir a imagem de outras pessoas, empresas e instituições. Isso pode ser enquadrado em vários crimes, o que, por si só, já contraria o conceito de liberdade de expressão. Além disso, o que essas pessoas falam não são suas ideias: servem apenas de caixa de ressonância para palavras de ordem de grupos específicos, prestando-se a viabilizar seus objetivos. Fazem isso por se alinharem com as ideias desse grupo ou para se sentir parte dele.
Como canta Caetano Veloso, “Narciso acha feio o que não é espelho” As pessoas não querem ser confrontadas com o que lhes incomoda. Por isso, se tornam presas fáceis de quem lhes agrada, mesmo que seja com a mais rotunda mentira!