Conheça o seu corpo: O Outubro Rosa e a evolução da medicina

Tratamentos mais avançados, precisos e com baixa toxicidade têm ajudado a transformar o câncer de mama em uma doença curável, e a manter a qualidade de vida da paciente. Mas a prevenção ainda é a maior aliada da mulher

Conheça o seu corpo: O Outubro Rosa e a evolução da medicina
Conheça o seu corpo: O Outubro Rosa e a evolução da medicina

Por Renata Rusky - Correioweb - 18/10/2020 11:19:59 | Foto: CorreioWeb

Se, por um lado, o tempo não é um aliado do câncer de mama, já que o diagnóstico precoce tem um papel importante para um bom prognóstico, por outro, o passar dos anos permitiu avanços que melhoraram bastante a forma como mulheres enfrentam a doença hoje. A começar pela quantidade de informações, que faz com que o câncer seja menos um bicho de sete cabeças e mais uma enfermidade.

Máquinas modernas conseguem diminuir a quantidade de sessões de radioterapia; exames preveem a chance de novos tumores e identificam a real necessidade de quimioterapia. Na parte estética, uma questão séria para as mulheres, a perda de cabelo pode ser evitada, a reconstrução das mamas após uma mastectomia, facilitada, e tatuagens ajudam no processo de curar feridas emocionais.

Além disso, se há 15 anos, o câncer se espalhasse para outras áreas do corpo (metástase), era algo contra o qual os médicos pouco podiam lutar. Agora, a doença caminha para se tornar crônica — e não letal. Em tratamento para que o tumor não progrida, mulheres vivem até mais de 10 anos, com qualidade de vida e bem-estar.

Isso não significa, porém, que a prevenção deva ser esquecida. Ao contrário. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), o reconhecimento adiantado do tumor possibilita que as chances de cura cheguem a 95%.

Depois do diagnóstico, há três anos, Nayara mudou radicalmente a vida, tanto pessoal quanto profissional: coragem até para trocar o direito por uma empresa de biscoitos (Carlos Vieira/CB/D.A Press)
Depois do diagnóstico, há três anos, Nayara mudou radicalmente a vida, tanto pessoal quanto profissional: coragem até para trocar o direito por uma empresa de biscoitos

Herança genética

Faz três anos que a empresária Nayara Santos Aguiar, 37 anos, recebeu o diagnóstico de câncer de mama, em outubro de 2017. Por ter histórico familiar da doença, fazia exames anualmente, sempre em outubro, justamente por causa da campanha de conscientização da doença, Outubro Rosa. No ano anterior, os exames não haviam apontado nada. O intervalo foi suficiente para aparecer um tumor de 2,5cm.

Ela lembrava de como havia sido quando a avó, que a criou, descobriu o câncer de mama. “O tratamento dela foi muito sofrido, cruel, difícil. E eu vi a diferença para o meu”, relembra. Nayara tinha 15 anos quando a avó morreu e a então adolescente veio morar em Brasília com a mãe. Passar por cirurgia e quimioterapia também não foi fácil para a empresária, mas, acima de tudo, ela tinha uma certeza. “Quando recebi o diagnóstico, minha mãe virou para mim e disse: ‘você sabe que o câncer, hoje, não mata mais tanto’. E eu respondi que morrer eu não iria.”

Com a oncogenética avançada, testes e mapeamentos genéticos que não existiam na época da avó permitiram que fosse descoberta uma mutação genética em Nayara que aumenta o risco de ela desenvolver tumores. Trata-se da síndrome de Li-Fraumeni. A predisposição a tumores levou à decisão de realizar a mastectomia bilateral. Depois, começaram as sessões de quimioterapia — quinze, no total.

Nayara não se reconhecia no espelho. Tinha cicatrizes, ficou inchada, ganhou 8kg, perdeu o cabelo, a sobrancelha, as unhas ficaram escuras e caíram, os dentes mudaram. “O câncer e o tratamento te transformam em algo que você nunca esperou ser, e isso é muito difícil, em especial para as mulheres, que são vaidosas”, comenta. Mas a empresária se considera sortuda por ter colocado próteses de silicone no mesmo procedimento da mastectomia, evitando mais cirurgias.

Não é questão de vaidade

O cirurgião plástico João Darques explica que a cirurgia plástica também tem um caráter curativo. “Muitas vezes, é vista como uma indústria de estética pura, e não é assim”, defende. Em alguns casos, são feitas três cirurgias ou até mais para reconstruir a mama, o que ele considera traumático. “Estudos mostram que quem tem a reconstrução imediata apresenta uma melhora funcional mais rápida, nos primeiros cinco anos, além de melhor qualidade de vida. Não é luxo, e é bom até para o mercado, pois aquela mulher vai voltar ao trabalho normal mais rapidamente”, explica.

Uma das alternativas, caso não haja pele suficiente para colocar a prótese de silicone no momento da mastectomia, é o chamado expansor de Becker. “Ele é um receptáculo de soro fisiológico, com uma válvula acessível. Vamos expandindo a pele com soro ao longo de cerca de seis meses. O corpo, então, vai, aos poucos, aumentando a pele, pelo mesmo mecanismo de quando engordamos”, explica Darques.

Nayara afirma com segurança que o câncer ajudou a mostrar quem realmente a ama. Em 2017, Nayara era casada, mas o marido saiu de casa logo que ela recebeu o diagnóstico. “Uma das minhas brigas e indignações é isso: o abandono do homem. Durante as sessões de quimioterapia, fazemos muita amizade e vemos que isso acontece com muita mulher”, lamenta. Mas se gaba de, hoje, ter um namorado que a olha e acha que ela é a mulher mais linda e incrível do mundo.

As mudanças não pararam por aí. Nayara era advogada e decidiu trocar de carreira. “Eu vi que não era isso que queria para a minha vida e resolvi correr atrás do que me deixa feliz”, conta. Hoje, ela é empresária, dona da M’s Biscoitos, e se sente muito mais realizada profissional e afetivamente.

Muita gente a chama de “guerreira”, ao que ela responde que guerreiros são os que a apoiaram no caminho. Ciente de que pode ter outros tumores, a empresária, além de tratamento hormonal, faz tudo o que pode para evitar novas incidências e repete os exames a cada seis meses. Ela alerta: “O ideal era que todo mundo tivesse essa noção (de que ninguém está livre do câncer de mama), que pode ter a qualquer momento”.

Doença variada, tratamento personalizado

Embora se fale em câncer de mama como uma entidade única, na verdade, são vários tipos de doença e, desde a cirurgia às sessões de radioterapia e quimioterapia, o tratamento é adequado a cada caso. “O mais comum é o que nasce nos dutos, os canais por onde o leite passa até o mamilo. É o carcinoma ductal — 90% das mulheres com câncer de mama têm esse. Já o carcinoma lobular se origina nos lóbulos, as células que produzem o leite materno”, explica a oncologista Ludmila Thommen, especializada em câncer de mama. Ambos podem ou não atingir os tecidos próximos.

Mas as variações entre os cânceres não param por aí. “Ao longo do tempo, evoluímos para fazer exames ainda mais específicos, como o imuno-histoquímico, usado desde os anos 1990. Nós pegamos o carcinoma e aprofundamos a análise para ver o que fez ele surgir”, cita. Cerca de 75% das mulheres têm tumores receptores de hormônios como estrogênio e progesterona, que ainda são divididos entre luminal A e luminal B; 20% dos casos são do tipo receptor da proteína HER-2; e o restante são os chamados triplo negativo, ou seja, não é receptor de nenhum dos dois hormônios nem da proteína.

“Os receptores hormonais têm uma célula redondinha que se liga aos hormônios e, assim, cresce e se prolifera. Portanto, precisa ser tratada com medicações que bloqueiam os hormônios”, detalha Ludmila. Já o HER-2 é um gene na célula que faz com que ela se multiplique de forma descontrolada. “As nossas células têm esse gene, mas, no câncer de mama, há excesso dele, que faz com que as células se proliferem de forma descontrolada, causando os tumores. Nesse caso, há a terapia bloqueadora do HER-2.”

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