Ana Paula Gomes de Oliveira, uma das fundadoras do grupo Mães de Manguinhos
Portal Brasil De Fato - 27/11/2025 08:14:58 | Foto: Reprodução/Youtube/@premiomartinennals
Ativista é a primeira brasileira a ser laureada com a premiação: 'Transformei a dor da perda em luta'.
Ana Paula Gomes de Oliveira, uma das fundadoras do grupo Mães de Manguinhos, na Zona Norte do Rio de Janeiro, recebeu um dos principais prêmios de direitos humanos do mundo, o Martin Ennals, na tarde desta quarta-feira (26), em cerimônia realizada em Genebra (Suíça).
A ativista é a primeira brasileira a ser laureada com a premiação que é formada por um júri de dez organizações que são referências no movimento de direitos humanos no mundo, incluindo a Anistia Internacional.
Durante a premiação, Oliveira agradeceu e desabafou sobre a busca por justiça por seu filho Johnatha, vítima de violência policial há 11 anos. “Estamos cansadas de esperar e lutar por justiça. Esse prêmio não ameniza a nossa dor, mas dá visibilidade e fortalece nosso grito. E é através da minha voz que eu honro a memória do meu filho e de todos os outros filhos que perderam suas vidas pelo Estado brasileiro”, disse. “É uma honra receber esse prêmio como mãe do Johnatha, mulher negra e defensora dos direitos humanos, nascida e criada na favela de Manguinhos.”
A ativista se tornou uma das principais lideranças em direitos humanos no país depois que o seu filho de 19 anos, Johnatha de Oliveira, foi morto com um tiro nas costas por um policial militar da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), em 14 de maio de 2014. O jovem estava a caminho da casa de sua namorada, também na favela de Manguinhos, na zona norte do Rio de Janeiro. Por causa do episódio que marcou sua vida para sempre, fundou o grupo Mães de Manguinhos, que reúne familiares de vítimas do Estado.
Luta incansável
A luta de Ana Paula Oliveira foi fundamental para conseguir o que, em casos de mortos em ação da polícia, é bastante raro: levar o caso a júri popular. Contudo, o resultado não foi exatamente o esperado. Em março do ano passado, o policial militar Alessandro Marcelino de Souza foi condenado por homicídio culposo, quando não há intenção de matar, pelo 3º Tribunal do Júri da capital.
Logo depois, a Defensoria Pública do Rio entrou com um recurso para que o cabo da PM responda por homicídio doloso, quando há a intenção de matar. Souza, que atirou sete vezes contra Johnatha, aguarda a conclusão do processo em liberdade.
Ao ser laureada, Oliveira afirmou que, desde que seu filho foi assassinado, precisou “transformar a dor da perda” em “luta contra a violência do Estado e o racismo existente no Brasil” que, em suas palavras, “teima em separar as mães negras de seus filhos seja através dos assassinatos, do alto índice de encarceramento da população negra negra ou dos desaparecimentos forçados após operações policiais”.
Oliveira também dedicou o prêmio à vereadora Marielle Franco, assassinada em março de 2018, no Rio de Janeiro. “Esse prêmio não é só meu, mas pertence a todas as mães que tiveram seus filhos assassinados por agentes do Estado no Brasil. Gostaria de dedicar esse prêmio com todo o meu amor a duas pessoas muito especiais que hoje não estão aqui fisicamente, mas que me acompanham e me inspiram a seguir pela força do amor que nos conecta. Eu dedico esse prêmio ao meu amado filho Johnatha e à maior defensora de direitos humanos que conheci no Brasil, Marielle Franco”, afirmou Ana Paula.
Além de agradecer, a ativista convidou a Organização das Nações Unidas (ONU) a pressionar o Estado brasileiro no combate à letalidade do Estado. “A espera por justiça adoece as mães e afeta a saúde mental de muitas de nós. Esta luta nos coloca em risco todos os dias, mas nós não permitimos que o medo nos paralise. Por isso, hoje eu faço um apelo à comunidade internacional, especialmente às Nações Unidas, para se juntarem a nós”, acrescentou.
“Nesses 11 anos, eu tenho dito que essa luta não pode ser somente das mães que perderam seus filhos que já estão adoecidas por conta dessa violência que nos atinge, mas precisa ser de toda a sociedade. Precisamos que o Estado brasileiro seja pressionado a tomar medidas urgentes para reduzir o alto índice da letalidade policial, para que haja reparação imediata à famílias e investigações imparciais independentes e efetivas. O Estado precisa ser responsabilizado em todas as cadeias de comando”, concluiu.
Editado por: Maria Teresa Cruz
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