Para bancada bala, pegou mal
Por caroline Oliveira - Portal Bdf - 17/11/2025 15:41:33 | Foto: O deputado federal e secretário de Segurança Pública de São Paulo agora licenciado Guilherme Derrite (PP) | Crédito: Marina Ramos/Câmara dos Deputados
Seu relatório chega à quarta versão, o que mostra dificuldades de articulação do ex-secretário com os colegas.
Ao se licenciar do comando da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, com apoio do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) para relatar o Projeto de Lei 5582/2025, o PL Antifacção, o deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP) se colocou no centro do jogo político em Brasília. Com as eleições gerais no horizonte, a tramitação da proposta se tornou o palanque do policial militar sorocabano para projetar seu nome para uma possível candidatura ao Senado. No total, serão eleitos dois novos representantes para o Senador por estado em 2026.
No entanto, as mudanças constantes no texto do PL com reclamações do governo e dos próprios aliados mostrou a fragilidade da articulação, além de “pegar mal” para aliados como a bancada da bala que queriam protagonismo no tema.
Entre idas e vindas do relatório de Derrite chegou a quatro versões – com possibilidade de quinta edição. Essas mudanças podem desfavorecer a balanço política do secretário. Um dos recuos que ganhou mais notoriedade foi sobre o papel da Polícia Federal no combate ao crime organizado.
O parecer previa a atuação conjunta ou coordenada da PF nos estados somente mediante autorização ou provocação dos governadores. A corporação reagiu e afirmou publicamente que a medida compromete o interesse público. Em resposta, Derrite incluiu no texto a possibilidade de atuação da Polícia Federal por iniciativa própria e “em caráter cooperativo” com as polícias estaduais, “sempre que os fatos investigados envolverem matérias de sua competência constitucional ou legal”.
Na última versão, o texto determina que os investimentos nas operações serão destinados pelo Fundo para Aparelhamento e Operacionalização das Atividades-Fim da Polícia Federal (Funapol) somente quando as ações forem realizadas pela PF. Em caso de atuação das policias locais, o fundo destinará recursos para as polícias locais. A base governista questiona a sugestão.
Em outro trecho sob holofotes, Derrite desistiu de equiparar os crimes cometidos por organizações criminosas ao terrorismo, o que poderia abrir brechas para intervenções estrangeiras como as que são realizadas hoje pelos Estados Unidos na Venezuela.
‘Derrota significativa’
Como consequência, a falta de consenso fez pairar dúvidas sobre a capacidade de Derrite em articular a viabilidade do projeto no Congresso, o que levou os governadores de direita do Consórcio da Paz a pedirem ao presidente da Câmara, o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), o adiamento da votação do projeto até que o Senado e o Supremo Tribunal Federal (STF) deem sinal positivo para a pauta. “Não nos interessa em nada aprovar uma legislação que fique parada no Senado ou que seja considerada inconstitucional pelo STF”, afirmou o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL).
Lincoln Telhado, cientista político e especialista em relações governamentais, avalia que se trata de uma “derrota significativa” para o ex-secretário paulista, sobretudo porque o consórcio é composto por governadores do mesmo campo ideológico, incluindo o próprio governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos ).
“O que era para ser uma rápida incursão dele aqui em Brasília acabou falhando, e isso é muito ruim politicamente para a imagem dele, porque evidencia publicamente talvez uma falta de capacidade de articulação. Em termos eleitorais, isso não necessariamente é ruim, mas, para as alianças políticas, é um pouco complicado, porque demonstra uma falha nessa capacidade. Isso pode até dificultar futuras alianças, pois pode passar a impressão, do ponto de vista dos partidos, de que ele não é alguém com quem seja fácil firmar parcerias”, analisa Telhado.
Pouco impacto eleitoral
O cientista avalia que não há um impacto eleitoral importante neste momento, já que, entre os nomes da direita cotados para disputar uma vaga ao Senado por São Paulo, Derrite ainda desponta como o mais viável. Outro nome que circula nos bastidores é o do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL). No entanto, o STF já formou maioria para tornar o filho do ex-presidente réu por tentar constranger ministros durante o julgamento da trama golpista, o que pode abrir caminho para uma eventual impugnação de sua candidatura.
“É muito pouco provável que o Eduardo Bolsonaro seja candidato. Mesmo que tente concorrer à distância, como tem sido cogitado, acho difícil que consiga. É provável que a candidatura dele seja impugnada. Então, os votos naturais do Eduardo Bolsonaro tendem a se dividir, e boa parte deles pode migrar para o Derrite, que é o candidato mais identificado com a direita”, afirma Telhado.

Guilherme Derrite deixou a secretário em São Paulo e foi para Brasília com apoio do governador Tarcísio de Freitas
Outra carta na manga é o apoio natural do governador, que conseguiu eleger o prefeito Ricardo Nunes (MDB) nas últimas eleições municipais. “O Derrite é o candidato apoiado por ele, e os dois são próximos. Por isso, mesmo com esse recuo, não vejo grande possibilidade de isso minar sua candidatura”, acrescenta o cientista.
Recentemente, em meio a rumores sobre uma possível exoneração de Derrite, Tarcísio fez elogios e afirmou que, se depender dele, Derrite permanecerá no cargo até o prazo de desincompatibilização, quando os candidatos precisam se afastar de funções públicas para disputar as eleições. Telhado afirma ainda que, “considerando o perfil do eleitorado paulista em que a direita tem mostrado força, especialmente no interior, a tendência é que o Derrite cresça, ainda mais com a provável saída de Eduardo Bolsonaro dos cenários testados pelas pesquisas”.
Para bancada bala, pegou mal
A disputa pelo texto final do PL Antifacção revela uma tentativa de polarizar com o governo federal, como uma estratégia eleitoral que pode alavancá-lo nacionalmente. Durante uma sessão solene realizada nesta quarta-feira (12) no Senado em homenagem aos policiais mortos e feridos na megaoperação nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, Derrite lembrou o episódio em que o presidente Lula classificou traficantes de “vítimas dos usuários”. “O Estado não pode tratar criminosos como vítimas. Esses heróis juram sacrificar a própria vida pela segurança do povo brasileiro”, afirmou.
Mas o cientista político Paulo Niccoli Ramirez, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), entende que a escolha de seu nome para a relatoria do projeto não agradou outros nomes da direita dentro do Congresso que já estavam envolvidos com a pauta. “Isso pegou um tanto mal dentro do Congresso, inclusive na bancada da bala, que está desde o início do mandato fazendo as suas articulações. E esse que, de repente, apenas com fins eleitoreiros, foi colocado como relator”, afirma Ramirez.
O professor também analisa que a tentativa de polarização pode repercutir de maneira negativa na sociedade, uma vez que o assunto da segurança pública é de interesse nacional, a despeito de posições políticas. “A segurança pública não precisa ser um tema só da esquerda ou da direita, mas de um novo pacto social que una especialistas para a discussão e diferentes visões políticas. Então, esse talvez tenha sido um erro estratégico do pessoal da direita ao tentar incorporar essa pauta, que já é deles há algum tempo, exatamente num instante de oportunismo político. E o efeito disso já está claro”, acrescenta.

A chegada repentina de Derrite no Congresso incomodou os deputados da bancada da bala
Além da polarização, Derrite parece usar a relatoria do PL para “limpar a sua imagem” ligada ao aumento da letalidade policial em São Paulo. Ao lado do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), a Polícia Militar de São Paulo somou 737 assassinatos em 2024, segundo dados do Grupo de Atuação Especial da Segurança Pública e Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público (Gaesp-MPSP). O número é 60,2% maior do que o registrado no ano anterior, 2023, o primeiro ano do mandato de Tarcísio, e 86% a mais do que o contabilizado em 2022, último ano de governo de João Doria e Rodrigo Garcia, ambos do PSDB, quando 396 foram mortos por policiais.
A partir dessa estratégia, o deputado vem se colocando como um político moderado e defensor dos interesses da sociedade, que majoritariamente tem tendência punitivista, como mostrou a pesquisa Genial/Quaest desta quarta-feira (12). Quase metade (46%) apontou que o enfrentamento ao crime passa por leis mais duras, penas mais longas e maior rigor do Judiciário. Na mesma direção, 88% dos participantes disseram considerar que as penas aplicadas hoje são brandas e deveriam ser mais severas, e 73% defenderam que as organizações criminosas sejam enquadradas legalmente como grupos terroristas.
Porém, a estratégia encontra um outro obstáculo que advém da realidade da sua gestão frente à pasta da segurança. Na próxima semana, no dia 18 de novembro, 22 entidades que representam policiais civis e militares de São Paulo farão uma manifestação contra Derrite e Tarcísio pelo descumprimento de promessas feitas durante a campanha de 2022, como plano de carreira, mudanças na jornada de trabalho e melhorias na remuneração.
Editado por: Luís Indriunas
Comentários para "Derrite testa sua força rumo ao Senado, mas uso eleitoral do PL Antifacção ‘pegou mal’ para a bancada da bala":