Entenda em sete pontos a investigação da PF e as mensagens que atingem Bolsonaro e aliados

Bolsonaro recebeu R$ 44 milhões desde 2023.

Entenda em sete pontos a investigação da PF e as mensagens que atingem Bolsonaro e aliados
Entenda em sete pontos a investigação da PF e as mensagens que atingem Bolsonaro e aliados

João Pedro Abdo, São Paulo, Sp (folhapress) - 22/08/2025 10:58:02 | Foto: Gustavo Moreno/STF

Na sexta-feira (15), a Polícia Federal apresentou relatório com o resultado das investigações sobre as tentativas de obstrução no julgamento da trama golpista que teriam sido perpetradas pelo pastor Silas Malafaia, por Jair Bolsonaro (PL), pelo seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e outros aliados do ex-presidente.

Malafaia foi alvo, na noite de quarta-feira (20), de uma operação da Polícia Federal que cancelou seu passaporte e apreendeu seu celular. As medidas cautelares foram impostas pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes.

O ex-presidente e seu filho foram indiciados e podem ser denunciados pela PGR (Procuradoria-geral da República) pelos crimes de coação no curso do processo e abolição violenta do Estado democrático de Direito, pelo qual Bolsonaro já é réu no Supremo. Entenda o que o relatório final do inquérito aponta contra eles.

ORIGEM DA INVESTIGAÇÃO
O inquérito que apurava as investidas contra a ação penal da trama golpista foi aberto em 26 maio, a pedido da PGR. A investigação foi deflagrada após manifestações do secretário de Estado do governo de Donald Trump, Marco Rubio, sobre sanções ao Brasil. O relatório de sexta (15) é resultado dessas investigações.

Com o anúncio do tarifaço e aumento da pressão contra o Judiciário brasileiro, Moraes determinou, em 18 de julho, uma operação de busca e apreensão na casa de Bolsonaro e na sede do PL (Partido Liberal). Na ocasião, o ex-presidente teve o celular apreendido, passou a usar tornozeleira eletrônica, foi proibido de acessar as redes sociais e sofreu outras restrições.

MENSAGENS E COORDENAÇÃO DE POSTS
A perícia realizada pela Polícia Federal no aparelho apreendido encontrou mensagens trocadas entre Bolsonaro, Eduardo, Malafaia e outros aliados. As informações obtidas baseiam tanto a decisão de Moraes que impôs as medidas cautelares ao pastor quanto o indiciamento do ex-presidente e de seu filho pela PF.

As conversas revelam xingamentos de Eduardo ao pai e ofensas de Malafaia a Eduardo pelas ações do deputado nos EUA. Nas mensagens, Bolsonaro mencionou diálogos com ministros do Supremo e pediu ao filho que poupasse o ministro do STF Gilmar Mendes.

O ex-presidente também encaminhou vídeos a contatos salvos sob os nomes "Negona do Bolsonaro" e "Dep BA Cap Alden", em referência ao deputado federal capitão Alden (PL-BA). Os mesmos vídeos foram publicados no X (antigo Twitter) em 3 de agosto, dia das manifestações bolsonaristas pela anistia.

PARTICIPAÇÃO DE MALAFAIA
O relatório afirma que as conversas mostram uma "adesão subjetiva ao intento criminoso" por parte de Malafaia. Para a investigação, o pastor incentivou que Bolsonaro descumprisse as cautelares de proibição ao uso das redes e orientou sobre estratégias na divulgação de conteúdos. O líder evangélico também revisou uma carta do ex-presidente que foi publicada nas redes sociais.

CONVERSAS COM ALIADOS
Segundo a PF, Bolsonaro também manteve interlocução com o advogado americano Martin Luca, representante da plataforma Rumble. As atividades da empresa foram suspensas após descumprimento de decisão do Supremo. O ex-presidente teve acesso a uma petição do processo movido na Justiça americana contra Moraes pela plataforma e pelo Trump Media Group, de propriedade do presidente dos EUA.

A investigação revela também uma mensagem enviada pelo general Braga Netto, com quem o ex-presidente estava proibido de se comunicar desde 8 de fevereiro de 2024. Nesse dia, foi deflagrada a operação Tempus Veritatis, que apreendeu o celular do general.

PEDIDO DE ASILO A MILEI
Outro fato destacado pela PF e por Moraes é a existência de uma minuta de pedido de asilo político endereçada ao presidente da Argentina, Javier Milei. O documento foi editado no dia 10 de fevereiro de 2024, dois dias depois da operação do dia 8, que também apreendeu o passaporte de Bolsonaro.

O risco de fuga foi levantado por Moraes quando as primeiras medidas cautelares, que incluíam o uso de tornozeleira eletrônica, foram impostas. Bolsonaro já havia falado publicamente sobre o assunto e passado dois dias na embaixada da Hungria.

MOVIMENTAÇÕES FINANCEIRAS
As investigações apontam que Bolsonaro e o filho Eduardo usaram as contas das esposas para movimentações financeiras. O ex-presidente transferiu R$ 2 milhões para Michelle Bolsonaro em 4 de junho, um dia antes de prestar depoimento à PF. Ele confessou que repassou a mesma quantia ao filho.

Bolsonaro omitiu no depoimento, entretanto, o repasse a Michelle e outras seis transferências por Pix feitas ao filho, que totalizaram mais de R$ 100 mil. Eduardo também fez dois repasses para a esposa, Heloísa Bolsonaro, "como forma de escamotear" os valores, segundo a Polícia Federal.

DESCUMPRIMENTO E PEDIDO DE EXPLICAÇÕES
Moraes considerou os fatos narrados pela PF como "reiterados descumprimentos das medidas cautelares impostas" e deu o prazo de 48 horas para que a defesa do ex-presidente explique as acusações.

Para o ministro, Bolsonaro descumpriu a ordem de proibição ao uso de redes sociais. Ele cita também "acentuado risco de fuga" em referência à minuta do pedido de asilo político. Moraes não menciona, entretanto, se decretará a prisão preventiva do ex-presidente caso as explicações não sejam satisfatórias.

Bolsonaro recebeu R$ 44 milhões desde 2023, sendo quase metade em Pix, aponta relatório da PF

RENATA GALF E JOSÉ MARQUES, SÃO PAULO, SP E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Jair Bolsonaro (PL) recebeu cerca de R$ 44,3 milhões em suas contas bancárias de março de 2023 a junho de 2025, apontam os dados da análise da Polícia Federal juntada ao inquérito sobre as suspeitas de obstrução do julgamento da trama golpista, que levaram ao indiciamento do ex-presidente e do seu filho Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

A análise se baseia em informações levantadas pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

A maior parte desse valor se concentra em apenas um ano, de março de 2023 a fevereiro de 2024, quando o ex-presidente recebeu pouco mais de R$ 30 milhões. Já o segundo maior montante recebido foi de 20 de dezembro de 2024 a 5 de junho deste ano, quando Bolsonaro recebeu R$ 11,1 milhões.

Ao todo, no período dos quase dois anos, R$ 20,7 milhões recebidos foram provenientes de transações em Pix -sendo que cerca de R$ 19,3 milhões foram enviados de março de 2023 a fevereiro de 2024. Enquanto o montante recebido do PL em todo o período, segundo esses dados, foi de R$ 1,1 milhão.

Em meados de 2023, aliados fizeram uma campanha para arrecadar dinheiro para Bolsonaro pagar multas e advogados, o que gerou uma onda de doações por Pix. O relatório da PF só relata os recebimentos mas não cita a campanha.

O órgão diz que há suspeitas de indícios de lavagem de dinheiro e de outros ilícitos penais por parte do ex-presidente e de Eduardo.

Procurada pela reportagem, a defesa de Bolsonaro não se manifestou sobre a análise da PF. Eduardo Bolsonaro não foi localizado para comentar.

Em relação ao indiciamento, a defesa do ex-presidente afirmou na manhã desta quinta-feira (21) que recebeu a notícia com surpresa e que "jamais houve o descumprimento de qualquer medida cautelar previamente imposta" pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Já Eduardo chamou, em nota na noite de quarta-feira (20), de "crime absolutamente delirante" os apontamentos que resultaram no indiciamento.

MOVIMENTAÇÕES EM CONTA
Segundo a análise da PF, Bolsonaro foi identificado como parte envolvida em comunicações reportadas por unidades de inteligência financeira ao Coaf. Ainda de acordo com a investigação, as operações financeiras com suspeitas de "lavagem de dinheiro e outros ilícitos" nas contas de Bolsonaro ocorreram entre 1º de março de 2023 e 5 de junho de 2025.

Apenas de 1º de março de 2023 a 7 de fevereiro de 2024, teriam sido movimentados R$ 30.576.801,36 em créditos e R$ 30.595.430,71 em débitos nessas contas, aponta a análise.

O documento registra nesse período o recebimento, via Pix, de R$ 19,3 milhões em 1.214.254 lançamentos. Já o PL, partido de Bolsonaro, que aparece como o principal pagador nesse período de um ano, transferiu o montante de R$ 291,7 mil a Bolsonaro. Os maiores gastos, por sua vez, foram feitos aos advogados do ex-presidente, no valor de R$ 6,8 milhões.

A PF afirma que foram analisadas 50 comunicações de operações financeiras que envolvem pessoas relacionadas às investigações da trama golpista. Dessas comunicações, quatro tratam de suspeitas relacionadas a Bolsonaro, e quatro, a Eduardo Bolsonaro.

Foram analisadas ainda outras transações feitas pelo ex-presidente e por seu filho. Parte delas é citada no relatório da PF que embasou o indiciamento dos dois, divulgado na quarta-feira (20).

O documento cita, por exemplo, que Bolsonaro transferiu R$ 2 milhões a Eduardo em 13 de maio de 2025, como foi informado pelo próprio presidente em depoimento. No entanto, também afirma que foram remetidos R$ 30 mil em março e R$ 40 mil em abril, quando Eduardo já estava nos EUA -de acordo com o texto, ele chegou ao país em 27 de fevereiro.

Em relação ao Bolsonaro, a PF diz que "chama atenção o volume de operações de câmbio realizadas ao longo do período analisado, que totalizaram R$ 105.905,54, especialmente considerando que o ex-presidente está com o passaporte retido e proibido de deixar o país".

A análise policial ainda ressalta a transferência de R$ 2 milhões de Bolsonaro à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro em 4 de junho deste ano, um dia antes de ele prestar depoimento na investigação. A PF entende que ele fez a transferência para a conta de sua esposa para evitar bloqueios de recursos.

O relatório da PF que embasou o indiciamento diz que também Eduardo usou conta de sua esposa para evitar bloqueios de recursos.

Segundo a investigação, o deputado fez dois repasses para Heloísa Bolsonaro "como forma de escamotear" os valores antes encaminhados a ele pelo pai.

Para a PF, a análise das transações aponta que Bolsonaro e Eduardo utilizaram "diversos artifícios para dissimular a origem e o destino de recursos financeiros, com o intuito de financiamento e suporte das atividades de natureza ilícita do parlamentar" no exterior.

Em depoimento à polícia, Bolsonaro já disse que as transferências a Eduardo foram abastecidas por campanhas de doação feitas por apoiadores do ex-presidente.

A investigação também afirma que Bolsonaro realizou 40 transações de janeiro a julho de 2025, entre saques em caixas eletrônicos e atendimento presencial em guichê bancário.

"No total, foram contabilizados R$ 130.800,00. Não se ignora a eventual necessidade do ex-presidente em realizar despesas de pequeno vulto, sobretudo durante deslocamentos e viagens realizadas ao longo de agendas públicas. Entretanto, o grande volume de transações em dinheiro físico é indício relevante no contexto probatório, considerando os riscos associados à falta de rastreabilidade e a possibilidade de financiamento de ações de caráter ilícito", disse a PF.

PF inclui mensagens sem elo com investigação em relatório sobre Bolsonaro às vésperas de julgamento

CÉZAR FEITOZA, BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A Polícia Federal incluiu em seu relatório final sobre a suposta coação de Jair Bolsonaro (PL) e seu filho Eduardo diálogos sem relação com os crimes investigados.

Além disso, parte do material tornado público na quarta-feira (20) pelo STF (Supremo Tribunal Federal) mostra divergências sobre a escolha de uma nova liderança para o espectro bolsonarista, expondo articulações políticas do grupo.

O inquérito no qual Bolsonaro e Eduardo foram indiciados investiga a possível prática dos crimes de coação e abolição do Estado democrático de Direito.

Aliados do ex-presidente criticaram o fato de o relatório da investigação ter sido enviado ao Supremo às vésperas do julgamento sobre a trama golpista. O presidente da Primeira Turma do STF, ministro Cristiano Zanin, marcou para o dia 2 de setembro o início da análise sobre o núcleo central da ação.

As conversas que constam do relatório da PF foram obtidas em um celular apreendido de Bolsonaro. São mensagens trocadas entre o ex-presidente e Eduardo, o pastor da Assembleia de Deus Silas Malafaia e o advogado americano Martin de Luca.

O relatório expõe uma guerra entre a família de Bolsonaro e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), nos primeiros dias após o anúncio do tarifaço de Donald Trump contra o Brasil.

Numa mensagem enviada ao pai, Eduardo afirma que Tarcísio nunca o ajudou no Supremo, a despeito do bom trânsito entre os ministros. "Sempre esteve de braço cruzado vendo você se foder e se aquecendo para 2026", escreveu.

Outra mensagem mostra uma ofensa de Eduardo ao pai por causa de Tarcísio.

Em entrevista ao portal Poder360 dias antes das mensagens do deputado, Bolsonaro havia dito que Tarcísio continuava sendo "o meu irmão mais novo" e elogiado seu trabalho à frente do Governo de São Paulo. Na sequência, afirmou que Eduardo, "apesar de ter feito 40 anos de idade agora, ele não é tão maduro assim".

Eduardo reagiu com raiva. "VTNC SEU INGRATO DO CARALHO'!, escreveu em maiúsculas, usando a sigla que significa "vai tomar no c...".

"Eu ia deixar de lado a histórico do Tarcísio, mas graça aos elogios que vc fez a mim no Poder 360 estou pensando seriamente em dar mais uma porrada nele, para ver se vc aprende", disse ainda Eduardo.

A Polícia Federal incluiu no relatório final 11 áudios obtidos no celular de Bolsonaro. A maioria foi extraída de conversas no WhatsApp entre o ex-presidente e Silas Malafaia.

Em um dos áudios, de 12 segundos, o presidente afirma que não poderia gravar um vídeo que o pastor o solicitava porque estava com crise de soluços. "Malafaia, eu estou com uma crise de soluço. A cada três segundos é uma crise de soluço. Está impossível gravar qualquer coisa. E essa crise está comigo há dias, ok? Se acalmar aqui eu faço", diz Bolsonaro na gravação.

O professor de direito penal da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) Davi Tangerino diz que a inclusão de conversas pessoais sem relação com os crimes investigados é uma prática comum nas instâncias inferiores.

O próprio presidente Lula (PT) teve um diálogo sem relação com as investigações, revelada após a exposição de grampos pelo então juiz Sergio Moro. Na época, o petista perguntou ao ex-ministro Paulo Vannuchi onde estavam as "mulheres de grelo duro do nosso partido". A defesa do petista também pediu à Justiça indenização pela exposição de diálogo privado entre Marisa Letícia e seu filho.

"Falta no Brasil uma norma expressa determinando que tudo quanto não seja relevante não deveria ser nem materializado nos autos, deveria ser pura e simplesmente descartado", diz Tangerino, que defende que a regulamentação seja aprovada pelo Congresso em um projeto sobre LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) para assuntos penais.

Ele avalia que o relatório sobre Bolsonaro e Eduardo tem excessos nas reproduções das conversas. "A parte sobre o Tarcísio não tem nenhuma relação com o processo. O Malafaia brigando com o Eduardo também", completa.

Tangerino afirma ainda que a divulgação do relatório às vésperas do julgamento de Bolsonaro no Supremo não é um ponto fora da curva porque os processos relatados pelo ministro Alexandre de Moraes têm sido mais rápidos que o comum.

O professor de direito processual penal da USP Gustavo Badaró também aponta excessos na divulgação das mensagens. O docente fez parecer sobre direito de defesa para as alegações finais dos advogados de Bolsonaro no caso da trama golpista, segundo a coluna Mônica Bergamo.

"Bolsonaro pedir asilo na Argentina, isso pode ter maior ou menor relevância para a investigação. Mas uma conversa que eu estou xingando o filho, dizendo que você é imaturo, discussões puramente políticas não interferem em absolutamente nada no processo", diz .

Ele avalia que parte do material divulgado pela Polícia Federal pode ter interesse em questões políticas ou sociológicas. Destaca, porém, que a legislação brasileira proíbe a divulgação de gravações que não interessem como prova.

"A ideia da lei era garantir a privacidade, a liberdade de comunicação; que só fique no processo o que interessa ao inquérito, aquilo que diz respeito ao crime que está sendo investigado", completa.

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