Papa Francisco enfrentou o período mais difícil de seu pontificado, afirmam especialistas

Denúncias de abuso sexual e oposição interna marcam o ano mais difícil do papa Francisco

Papa Francisco enfrentou o período mais difícil de seu pontificado, afirmam especialistas
Papa Francisco enfrentou o período mais difícil de seu pontificado, afirmam especialistas

Do Estadão Conteúdo - Foto Pública - 30/12/2018 22:53:08 | Foto:

Não está sendo nada fácil para Jorge Bergoglio ser o papa Francisco . O argentino que conquistou o mundo com seu carisma e seu jeito pastoral de acolhimento enfrentou, em 2018, o ano mais complicado do pontificado. No centro estão as denúncias de abusos sexuais na Igreja Católica - sobretudo nos casos ocorridos no Chile e nos Estados Unidos - e a forte oposição de setores do cardinalato.

“Essa oposição, que existe em alguns setores, vem crescendo desde a eleição do Santo Padre. Foi aprofundada com a publicação de Amoris Laetitia ( exortação apostólica de Francisco, de 2016 ) e, mais recentemente, com os escândalos de abuso sexual”, comenta o padre jesuíta americano James Martin, consultor do Vaticano. “As mesmas pessoas que estavam contra o papa no começo agora o criticam pela forma como ele lida com a crise dos abusos. Desnecessário dizer que essa crise é um enorme problema, o maior da Igreja, mas alguns desses clérigos estão a usá-la de maneira conveniente para atacá-lo.”

Martin concorda que este foi o ano mais difícil do pontificado de Francisco. “Os abusos sexuais são o maior problema enfrentado pela Igreja e este ano tem sido o pior para a Igreja desde pelo menos 2002. Portanto, a pressão sobre Francisco tem sido extraordinária”, comenta.

A suposta maré conservadora, na verdade, tem favorecido

Francisco, pois muitos setores sociais no mundo inteiro se voltam para ele como uma liderança moral e até política alternativa

Francisco Borba Ribeiro Neto, Professor da PUC-SP

O vaticanista brasileiro Filipe Domingues, pesquisador da Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma, destaca que há dois grupos claros de oposição a Francisco: o primeiro, mais progressista e liberal nas questões morais, que já era contrário aos papas anteriores; o segundo, mais conservador, “que foi se organizando ao longo dos anos”.

“A reação foi se fortalecendo com algumas mudanças de discursos, por exemplo, quando o papa disse ‘quem sou eu para julgar?’, quando lhe perguntaram sobre a questão homossexual . Ou mesmo essa visão mais pastoral de aceitar, em alguns casos, que divorciados em segunda união possam receber sacramentos”, disse Domingues.

O papa também criou resistências ao assumir uma postura de defesa do meio ambiente e em discursar fortemente contra as armas. “Ele mexe com uma elite conservadora do mundo, com uma direita política conservadora, sobretudo nos Estados Unidos”, afirmou o vaticanista brasileiro.

Um dos momentos críticos deste 2018 foi quando, em agosto, o arcebispo de Ulpiana ( Kosovo ), Carlo Maria Viganò, ex-núncio apostólico nos EUA, pediu que Francisco renunciasse . Em carta, Viganò afirmou que havia avisado o papa dos problemas de abusos sexuais nos Estados Unidos desde 2013.

Escândalos de abuso sexual.

Para o sociólogo e biólogo Francisco Borba Ribeiro Neto, professor e coordenador do Núcleo Fé e Cultura da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), dois fatores aumentaram a oposição a Francisco: a reação conservadora à Amoris Laetitia e o impacto de escândalos de abuso sexual de crianças . “Isso gerou reação da oposição laicista na sociedade, que sempre ficou muito incomodada com a liderança mundial de Francisco”, comenta. “Nesses casos de pedofilia, o papa foi envolvido pela situação, no sentido que houve má administração local dos problemas e o Vaticano foi comprometido por ter confiado nas autoridades regionais.”

Outro ponto analisado pelos especialistas é que Francisco, apesar de ser o líder de uma instituição essencialmente conservadora, é uma progressista voz mundial em meio à ascensão de líderes reacionários, como o presidente dos EUA, Donald Trump , e o recém-eleito presidente do Brasil, Jair Bolsonaro .

“Papa Francisco é hoje a única autoridade moral internacional. A única pessoa que é uma referência moral para o mundo inteiro”, define Domingues. “Não sobrou ninguém que seja assim - tinha o Nelson Mandela , a Madre Teresa de Calcutá e outros líderes históricos que eram autoridades morais, que as pessoas paravam para ouvir.”

Afeto, sentido na pele

São quase 18 horas de domingo na Avenida Paulista . Bem no fim da via, fica a Igreja de São Luiz Gonzaga e bastam alguns minutos à porta para ver que boa parte do público que vai assistir à homilia é o mesmo que andava pelo entorno.

“Curto a vida cultural, deixo as crianças gastarem energia e venho abastecer o espírito”, conta o economista Pedro Araújo, de 41 anos, com os filhos de 8 e 11 anos. A missa entrou na programação no último ano. “Nasci, cresci e me casei na Igreja, mas parei de frequentar após o divórcio. Agora voltei porque tenho me sentido acolhido.”

Ao ser perguntado sobre o motivo do acolhimento, Araújo não titubeia: “O papa prega isso o tempo inteiro. Ele quer que todos sejam incluídos. E aqui, nesta paróquia, é o que sinto. Pode entrar todo mundo: cabeludo, tatuado, divorciado, homossexual”.

A menos de 5 km, no Jardim Paulista, zona oeste, a pedagoga Maria de Lourdes, que frequenta a Paróquia São Gabriel Arcanjo, conta que se surpreendeu outro dia ao ver moradores de rua participando da missa e até comungando. “Ninguém se escandalizou. Pelo contrário: elogiaram.”/ Colaborou Ocimara Balmant*

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