Jesus não é super-homem nem charlatão, diz Leão 14 na homilia da 1ª missa

Leão 14 está aberto a debater papel de mulheres e bênção a homossexuais, mas com cautela, dizem cardeais brasileiros

Jesus não é super-homem nem charlatão, diz Leão 14 na homilia da 1ª missa
Jesus não é super-homem nem charlatão, diz Leão 14 na homilia da 1ª missa

André Fontenelle, Roma, Itália (folhapress) - 10/05/2025 20:09:32 | Foto: Vatican News

ANDRÉ FONTENELLE, MOSCOU, RÚSSIA (FOLHAPRESS) - Em encontro na tarde desta sexta-feira (9) no Kremlin, Luiz Inácio Lula da Silva e Vladimir Putin afirmaram que as boas relações entre Brasil e Rússia se devem também às relações pessoais entre os dois presidentes. "Tenho boas lembranças de nossas conversas anteriores, tanto na Rússia quanto no Brasil. Elas foram realizadas em uma atmosfera muito amigável e de maneira profissional. Conseguimos melhorar significativamente as relações entre nossas nações, em grande parte graças aos nossos contatos pessoais", declarou o presidente russo, logo no começo da bilateral.

Lula concordou. "Sempre me lembrarei da maneira atenciosa com que o presidente Putin abordou nossas discussões, bem como do valioso diálogo entre nossos ministros das Relações Exteriores", disse, citando os nomes de Mauro Viera e Sergei Lavrov, presentes ao encontro. "Estamos tratando de questões de grande importância para nossas duas nações."
Em dez minutos de reunião aberta à imprensa, os dois recordaram que há 15 anos Lula esteve em Moscou para os 65 anos de aniversário da vitória soviética na Segunda Guerra. Classificando a atual festa, de 80 anos, como extraordinária, Lula passou longe de qualquer referência à guerra da Ucrânia, que rendeu pesadas críticas a Putin nesta semana, notadamente de líderes europeus.

Assim como a China e a Índia, o Brasil não participa do esforço liderado pela União Europeia para isolar Putin. Desde a invasão da Ucrânia, o apoio, sobretudo da China, se tornou uma linha vital para a economia russa. Lula e o líder chinês, Xi Jinping, usaram o multilateralismo para justificar a presença em Moscou durante as celebrações de Putin que marcaram os 80 anos do fim da Segunda Guerra na Europa. Na noite de quinta-feira (8), eram os principais convidados do líder russo a um jantar oferecido no Kremlin.

O momento mais agudo do presidente brasileiro no encontro foi quando comentou sobre as tarifas defendidas por Donald Trump, que "colocam por terra o livre comércio" e podem afetar "o respeito à soberania de alguns países". O discurso de Lula chegou ao presidente americano após recordar que o mundo projetado após a Segunda Guerra, calcado no multilateralismo e no fortalecimento da ONU, não estava se tornando realidade.

O presidente brasileiro também colocou Rússia e Brasil como parceiros do sul global, em uma manifestação que concorre com o diálogo da véspera entre Xi e Putin. O líder chinês e o anfitrião também fizeram coro à atitude americana hostil e defenderam o papel da ONU. "Tanto a Rússia quanto a China acreditam que a ONU e seu Conselho de Segurança devem continuar desempenhando o papel central nos assuntos globais", declarou o presidente russo.

Lula lembrou da relação comercial entre os dois países, de US$ 12 bilhões, "amplamente favorável à Rússia", notou o presidente com um sorriso, sobretudo pela compra de petróleo do Brasil. Aproveitou a deixa para introduzir Fernando Queiroz, CEO da Minerva, que faz parte da delegação brasileira e estava na reunião. O intuito, segundo Lula, era incentivar a importação de carne pela Rússia, com a introdução na conversa do principal exportador do produto para o país.

Também defendeu convênios nas áreas de ciência e tecnologia. Segundo a imprensa russa, o Brasil pretende promover parcerias na área de energia. "Temos muito interesse em estabelecer a relação com a Rússia nas pequenas usinas nucleares", declarou Lula, exatamente no momento em que os jornalistas eram retirados da sala em que ocorria a reunião. É um projeto discutido entre os países desde 2023.

Lula se encontrou na sequência com Robert Fico, primeiro-ministro da Eslováquia, outra figura controversa do cenário europeu. O populista foi o único líder da União Europeia a comparecer no evento organizado por Putin. Países europeus, que comemoram a rendição da Alemanha nazista no dia 8, não economizaram críticas ao presidente russo, acusando-o de agressor e de instrumentalizar o evento histórico para justificar a invasão à Ucrânia.

A viagem internacional do presidente brasileiro prossegue neste sábado (10), quando embarca para a China, onde cumpre visita oficial nos dias 12 e 13.

*

Leão 14 está aberto a debater papel de mulheres e bênção a homossexuais, mas com cautela, dizem cardeais brasileiros

Numa entrevista coletiva na na tarde desta sexta-feira (9), em Roma, os sete cardeais brasileiros participantes do conclave que elegeu Robert Prevost como Leão 14 relataram a experiência e projetaram os rumos da Igreja sob o novo papa, com quem haviam almoçado instantes antes.

O arcebispo de Manaus, dom Leonardo Steiner, afirmou que a ampliação da participação das mulheres na Igreja e a bênção a homossexuais foram questões abordadas com o novo pontífice, que estaria aberto a debatê-las. "Tenho certeza de que o papa Leão não vai tolher o diálogo. Pelo contrário."
O presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), dom Jaime Spengler, elogiou a participação das mulheres no trabalho comunitário, mas adotou cautela sobre como o papel delas na Igreja poderia ser ampliada.

"O que seria de nossas comunidades sem as mulheres? Sem as tantas catequistas, ministras da eucaristia, ministra das exéquias? As mulheres em nossas comunidades desenvolvem um ministério extraordinário", afirmou.

O cardeal manteve o mesmo tom pouco assertivo diante de pergunta sobre se a Igreja de Leão 14 irá apoiar a bênção de homossexuais. "A Igreja sempre deu a bênção a quem se aproxima pedindo a bênção. A bênção não é sinônimo de sacramento. O último documento do Dicastério para a Doutrina da Fé trouxe indicações preciosas nesse sentido e que merecem talvez aprofundamento", declarou.

Segundo o cardeal, existem grupos de trabalho designados para questões sensíveis como essas "Creio que precisamos de tempo. E aquilo que a Igreja sempre orientou: discernimento. E o discernimento exige saber do que estamos falando, da capacidade de realizarmos juntos e a disposição para o diálogo fraterno. É um caminho que, sim, precisamos avançar, mas também de tempo."
'ESQUECE AQUILO DO FILME'
Sobre os bastidores da votação, dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, disse que "a fantasia da opinião pública é muito fértil, ainda mais depois do filme", em referência ao longa "Conclave". "Mas esquece aquilo do filme", declarou.

Segundo dom Odilo, "no intervalo [entre votações] a gente volta para [a Casa] Santa Marta, faz refeição, conversa, isso é previsto para ir formando sua opinião".

O cardeal afirmou, porém, que essas conversas não se tornam "uma espécie de comício com apresentação de candidato". Dom Odilo disse que sentiu "uma responsabilidade muito grande". "Ainda mais pelo fato de a gente entregar o voto -isso é público- diante de um imenso crucifixo e da cena do Juízo Final na Capela Sistina."
O arcebispo de Salvador, dom Sérgio da Rocha, disse ver uma proximidade entre o novo papa Leão 14 e seu antecessor, Francisco.

"Apesar da importância da origem americana, sem dúvida o papa tem esse coração muito em sintonia com a Igreja na América Latina, e isso vai contribuir para a sua missão no mundo de hoje. Nesse aspecto há uma grande continuidade. O cardeal Prevost já tinha Francisco no nome, Francis, mas também no coração. E a Igreja certamente tem ambos no coração", afirmou. O nome de batismo do novo pontífice é Robert Francis Prevost.

Dom Sérgio também disse que a eleição de Leão 14 é um sinal do fortalecimento da América Latina dentro da Igreja. Embora Prevost seja americano de nascimento, ele fez a maior parte de sua carreira religiosa no Peru, é tem a nacionalidade do país.

"O fato de termos os dois últimos papas, podemos dizer, da América Latina mostra que graças a Deus a Igreja da América Latina tem feito uma caminhada pastoral de relevância internacional", disse ele. "É interessante a reação de alguns cardeais depois da eleição, de dizer 'pois é, a América Latina está oferecendo mais um papa.' Pois é, ontem eu ouvi isso."
O arcebispo emérito de Aparecida, dom Raymundo Damasceno, disse esperar que o novo papa Leão 14 seja um defensor da paz.

"Pelos depoimentos que tenho a gente percebe é um papa mais idôneo, mais adequado para os momentos atuais da Igreja e do nosso mundo. Um papa que começou lá na base, em nosso mundo tão dividido, marcado por tantas guerras, com essa palavra tão ansiada por todos nós: a paz. Certamente ele será um dos grandes produtores da paz no mundo de hoje", afirmou ele.

"Uma paz não armada, ou desarmada é melhor, mas uma paz que se obtém pelo diálogo, na verdade, na justiça no amor, para encontrarmos uma convivência harmoniosa entre todos os povos."
Sobre a escolha do nome Leão 14, dom Leonardo a associou à ênfase na doutrina social da Igreja. "A gente não pode se esquecer que São Francisco tinha um grande companheiro, que era Leão. Não sei se os dois se encontraram (risos). Mas a Igreja não pode deixar de lado essa questão. Essas questões sociais sempre terão que estar presentes. E o papa tem uma grande sensibilidade para isso."
"Não esqueçamos que a diocese dele era bastante pobre", prosseguiu dom Leonardo.. "Essas questões mais macros, a Igreja tem procurado abordar através da doutrina social. Ele certamente não vai se eximir dessa questão toda, as periferias, os povos originários, a questão do meio ambiente, onde as pessoas estão sofrendo. É claro que devagarinho (ele) vai entrando nesse mundo todo, como o papa Francisco, e vai nos ajudar a trilhar o caminho da paz, da verdade e da libertação."
Dom Odilo complementou: "Por certo [a escolha do nome] não tem a ver com a simbologia do bicho Leão, mas tem a ver com a simbologia dos papas Leão. O Concílio de Nicéia teve o primeiro Leão grande, que foi muito importante na história da cristologia, da teologia".

"No início do conclave tivemos a palestra do cardeal [italiano Raniero] Cantalamessa, que falou sobre a importância de voltar a uma boa cristologia. Eu estou achando que é por aí."

'Sentimos que era ele', diz cardeal francês sobre Prevost durante conclave

ANDRÉ FONTENELLE, ROMA, ITÁLIA (FOLHAPRESS) - "Ontem à noite, fomos hipervencedores." Assim o arcebispo de Argel, o francês Jean-Paul Vesco, 63, descreveu o clima na Capela Sistina, encerrado o conclave. Vesco falou longamente sobre detalhes da eleição do papa, reservando o sigilo aos temas interditados, como o resultado das votações.

"Quando há uma campanha [eleitoral], quando sai o resultado, filmam o lado dos que ganharam e o lado dos que perderam. Ali, não havia lado. Havia alegria de todo mundo, havia apenas hipervencedores", explicou, na saída da missa rezada por Leão 14 para os cardeais.

Vesco contou que Prevost não estava de fato entre os favoritos no início, mas que, em um determinado momento, que ele não soube definir, a maré mudou. "Sentimos que era ele e todos concordamos", afirmou o líder religioso.

Ele disse que "muitas coisas o impressionaram" no conclave. "Temos a impressão de estar entrando em algo muito grande, muito ritual."
Bem-humorado, Vesco disse que, mesmo tendo gostado da experiência, não quer vivenciá-la de novo. "De forma alguma. Primeiro, porque desejo uma vida longa [ao papa]. Não quero me projetar nesse momento, porque quero viver esses 15 anos", disse, numa aparente referência à expectativa de vida dos papas (Leão 14 tem 69 anos).

Ele admitiu que passa pela cabeça dos cardeais -inclusive ele, que seria considerado um azarão- a possibilidade da própria eleição. "Porque na lista de papáveis que vocês [da imprensa] fizeram, todos os que estão nela dizem: 'Posso ser eu.' Então, tenho que me preparar. E, obviamente, para se preparar, a gente se imagina um pouco. A gente se projeta."
Acrescentou, porém, ter ficado emocionado com o desprendimento dos cardeais favoritos.

"Na vida, somos alimentados, talvez, pela ambição, pela inveja. E, obviamente, nos dizem: 'Por que não você? Por que não você?' E acho bonito ver todos esses homens inteligentes, que têm tudo o que é preciso, que poderiam dizer a si mesmos: 'Sim, por que não eu?', terem essa lealdade, esse reconhecimento, na alegria. Fiquei muito emocionado com aqueles que, ao contrário de mim, podiam realmente dizer: 'Posso ser eu'."
Vesco admitiu ter estranhado inicialmente o nome "Leão". "Quando ele nos disse Leo -'Leão' em latim-, pensamos: 'Quem ainda põe no filho o nome de Leão hoje em dia?' Só que o bonito é que o povo cantou 'Leone, Leone...' O ritmo foi encontrado instantaneamente e isso me tocou muito", afirmou.

O cardeal brincou quando um repórter lembrou que ele poderia ser excomungado por contar segredos do conclave: "Agora só ele [Leão 14] pode fazer isso. Mas não seria muito bacana da parte dele. Acabamos de fazer o serviço!".

Comentários para "Jesus não é super-homem nem charlatão, diz Leão 14 na homilia da 1ª missa":

Deixe aqui seu comentário

Preencha os campos abaixo:
obrigatório
obrigatório