Dez anos antes da queda do Muro de Berlim, Deng Xiaoping iniciava as reformas econômicas, depois copiadas pelo Vietnã
Carlos Alberto Sardenberg O Globo - Tribuna Da Internet - 18/07/2021 08:12:42 | Foto: Tribuna da Internet
Do final dos anos 1980 e ao longo dos 90, os países socialistas ou comunistas caíram no capitalismo, exceto dois, Cuba e Coreia do Norte. A História mostrou três tipos de transição. O primeiro modelo é o chinês. Também o mais antigo. Dez anos antes da queda do Muro de Berlim, Deng Xiaoping iniciava as reformas econômicas, depois copiadas pelo Vietnã.
Nesse modelo, o Partido Comunista comanda a introdução dos grandes investimentos privados estrangeiros. É um passo obrigatório para países sem capital, sem tecnologia e infraestrutura, e também, naturalmente, sem empreendedores privados nacionais.
FAZ UMA MISTURA – Os empreendedores nacionais acabam aparecendo no decorrer do tempo, formando-se uma combinação entre empresas nacionais e estrangeiras. É nesse nível, da competição entre grandes multinacionais, que se dá hoje a disputa geopolítica entre Estados Unidos e China.
Até aqui, a coisa está funcionando, quando se consideram os indicadores econômicos. Há forte crescimento da produção, da renda e do emprego. Sem liberdades, a não ser a de abrir um negócio.
Não se sabe, entretanto, até onde vai. A população enriquece, torna-se classe média, com acesso cada vez maior à educação e progressivamente exposta ao mundo das democracias ocidentais.
EXEMPLO SUL-COREANO – Pode ser que ocorra algo como o que se passou na Coreia do Sul, cuja arrancada para o desenvolvimento também se deu com uma ditadura política, embora não comunista. O país alcançou a democracia por pressão das classes médias. Mas a China é muito maior, mais complexa, e a ditadura muito mais forte.
O segundo modelo é o da Europa do Leste: Polônia, República Tcheca etc. A virada é completa, com a introdução simultânea do capitalismo e da democracia política — aliás, requisito para entrar na União Europeia, como muitos já fizeram.
O terceiro e pior modelo é o da falecida União Soviética. O pessoal do partido ficou com as maiores estatais privatizadas e as melhores oportunidades de negócios, tudo a preço de banana roubada.
ESTILO PUTIN – Também manteve o poder político no novo regime, chamado de democrático, com eleições nacionais, mas sem imprensa livre e sem liberdade partidária. O nome disso é autocracia à Vladimir Putin.
E Cuba depois dos Castros? Trata-se de uma ditadura extrema e cruel, fiel ao comunismo. A ilha só teve momentos bons quando recebia ajuda externa. Primeiro, da União Soviética. Quando esta desabou, Cuba entrou na primeira grande crise econômica e social, nos anos 1990.
Foi então que Fidel permitiu uma tímida abertura. Tipo: famílias puderam transformar suas casas em pequenos restaurantes. Mas Fidel nunca se convenceu mesmo dessas pequenas aberturas.
SURGIU CHÁVEZ – Depois, a ilha deu sorte: Chávez. O coronel passou a entregar petróleo quase de graça, resolvendo o principal problema. Quase 100% da energia em Cuba é gerada por termelétricas.
Quando a Venezuela começou a naufragar, e a economia comunista continuava incapaz de gerar produto, Raúl Castro voltou a promover algumas aberturas, tímidas, como a permissão para a compra e venda de automóveis usados.
O atual governo cubano, comandado por Miguel Díaz-Canel, encontra-se num dilema: a necessidade de avançar nas reformas liberais e a fidelidade ao legado dos Castros. Estava levando assim quando eclodiram as grandes manifestações da semana passada, estimuladas pela internet.
INTERNET MÓVEL – Há pouco tempo, Díaz-Canel autorizou a internet móvel. Foi por esse meio que as oposições começaram a se manifestar, e as pessoas a trocar informações sobre a dificuldade de obter comida, remédios, roupas, eletrodomésticos e empregos.
A pandemia entornou o caldo. O governo reagiu com forte repressão, cancelou a internet e anunciou algumas medidas, como a possibilidade de os viajantes ao exterior trazerem mais comida e remédios. Nada.
Põe a culpa no embargo americano — que é um problema, mas não o principal. Afinal, Cuba negocia intensamente com China, Espanha e outros países europeus.
DITADURA POBRE – O problema é que, exportando açúcar e charutos, não gera renda suficiente.
Parece uma ditadura forte, mas outras já caíram por força do povo nas ruas.
O certo é que o embargo não cai, nem o mundo apoiará Cuba enquanto o governo cubano não der os primeiros passos na direção da abertura econômica e política.
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