O país parece de novo dividido entre os que disparam e os que rezam
Por José Seabra - Portal Notibras - 31/10/2025 19:09:36 | Foto: Fernando Frazão
A chacina que ensanguentou o Rio de Janeiro, com mais de 120 mortos em uma operação “integrada”, não nasceu do acaso nem do caos urbano. Foi parto induzido. Uma cesariana política feita com bisturi militar e mãos frias. Isso me foi confidenciado nesta quinta, 30, por um membro do alto escalão do governo, que transita com liberdade nos corredores do Planalto, do Congresso, do Judiciário e até da Esplanada dos Ministérios.
Para justificar essa revelação, lembrou-se que a Força Integrada de Combate ao Crime Organizado (FICCO), essa criatura híbrida gestada dentro do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), é apresentada ao público como um exemplo de cooperação entre União e Estados. Reúne Polícia Federal, PRF, Polícia Penal, e as forças estaduais Civil e Militar, tudo sob o lema da “integração”. Mas o que parece sinergia institucional pode esconder, sob o manto da eficiência, um laboratório de lealdades cruzadas.
Eis o dado que acende o pavio: o Diretor-Geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou que o Governo Federal sabia previamente da operação no Rio. Mesmo assim, o Ministério da Justiça — o mesmo que abriga a FICCO — decidiu não se envolver, sem sequer alertar seus superiores. Um silêncio que cheira mais a cálculo do que a cautela.
Não se trata de um delegado qualquer. Andrei foi chefe da segurança de Lula em 2022, indicado por Dilma Rousseff, e também ocupara cargos estratégicos durante o governo Bolsonaro — inclusive sob o comando de Sandro Avelar (hoje Secretário de Segurança do DF) e Valdecir Urquiza Jr. (atual Secretário-Geral da Interpol). Um mapa curioso de conexões entre mundos que se dizem opostos, mas que, nas sombras, parecem dividir o mesmo copo.
Quando Andrei afirmou publicamente que o governo sabia de tudo, o ministro Ricardo Lewandowski o interrompeu, com a fleuma dos velhos magistrados. Disse o ministro que “sem comunicação ao alto escalão, não há como afirmar que houve prévio aviso”. Numa tradução livre, é como afirmar que há zonas de penumbra dentro do próprio Planalto, e que nelas, o poder opera com autonomia e segredos.
Em todo esse contexto, há uma pergunta que não cala: há gente armada dentro do governo Lula 3, tramando contra um possível Lula 4?
No Distrito Federal, a militância do PT sussurra há meses que o Planalto está infestado de bolsonaristas, mantidos em cargos de confiança e contratos terceirizados. Ninguém sabe ao certo quem alimenta a serpente. Mas alguém, em algum gabinete refrigerado de Brasília, sabia que Lula estaria incomunicável, a bordo de uma aeronave sem sinal de telefone ou internet, justamente quando o Rio mergulhava em sangue.
Diante disso, fica outra dúvida: a chacina foi uma mera coincidência ou uma mensagem?
O país parece de novo dividido entre os que disparam e os que rezam. A diferença é que, agora, o fogo vem de dentro. E talvez o verdadeiro campo de batalha não seja o Alemão nem a Penha — mas o próprio coração do poder.
Talvez o grande mistério não seja quem puxou o gatilho no morro, mas quem acendeu o charuto no gabinete. Porque, no Brasil, o crime raramente nasce no beco, mas costuma, sim, ser redigido em papel timbrado. E quando o Estado resolve “integrar forças”, o que se vê é uma coreografia de conveniências, onde cada farda dança conforme a música do poder.
No fim das contas, o tiroteio é só o som ambiente de um país que aprendeu a conspirar contra si mesmo. Enquanto isso, os generais de terno e gravata ensaiam, em silêncio, o golpe mais sofisticado de todos – o de parecer legal.
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José Seabra, diretor da Sucursal Regional Nordeste de Notibras, está de passagem por Brasília
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